Sumário: 1. Apresentação; 2. O autor; 3. As
restrições do Exame e do fechamento de vagas nos cursos de Direito; 4. Os argumentos
do Dr. William Douglas; 5. O Exame da OAB, um mensurador externo da qualidade
das instituições; 6. Considerações, ou perguntas, finais.
1. Apresentação
O Jus Navigandi publicou, recentemente, sob o
título “Exame da OAB. Constitucionalidade e Conveniência”, (veja aqui) um
artigo do Juiz Federal e Professor William Douglas, no qual esse autor, após
examinar recente decisão de uma Juíza Federal do Rio de Janeiro, que considerou
inconstitucional o Exame da OAB, para determinar que a OAB/RJ concedesse o
registro profissional aos impetrantes, sem a exigência da aprovação no referido
Exame, concluiu que: ”O Exame não só não
é inconstitucional, como é, na prática, extremamente conveniente ao interesse
público. (...) deve ser mantido e estendido a outras carreiras. (...) se a
formação superior é ruim e não está sendo objeto de correção em tempo oportuno,
entendemos que tais exames são, na pior das hipóteses, o menor dos males. (...)
ainda é melhor que haja tais exames, para a proteção da sociedade” (...) servindo “de estímulo aos acadêmicos e
às instituições de ensino, a fim de que tornem o processo de ensino e
aprendizagem algo efetivo e não apenas uma pavorosa encenação.”
Confesso que fiquei decepcionado ao ler esse
artigo, exatamente de um dos autores de dois dos livros que eu costumo
recomendar aos meus alunos, o Direito Constitucional e o Controle de
Constitucionalidade, de Sylvio Motta e William Douglas.
2. O autor
O Dr. William Douglas é juiz federal e professor de
Direito Processual Civil e Penal, lecionando atualmente na Universidade Salgado
de Oliveira, a Universo de Niterói, no Rio de Janeiro. Ele é também autor
consagrado, com diversas obras publicadas, em especial as destinadas à preparação
para concursos públicos. Especificamente a respeito do Direito Constitucional,
o Dr. William Douglas publicou, em parceria com o Professor Sylvio Motta,
várias obras destinadas à preparação para concursos públicos e exames da OAB, e
também um trabalho referente ao controle de constitucionalidade. Essa parceria
é antiga, como revelou, em entrevista, o Professor Sylvio: “A minha amizade com William já
conta alguns lustros e só é superada em intensidade pela admiração que nutro
por ele, quer como juiz, escritor, palestrante ou professor. Nos conhecemos
quando fazíamos prova para delegado de polícia no Rio e, de lá pra cá, sempre
andamos juntos. Escrevemos juntos, falamos em Congressos, coordenamos a Impetus
e a Companhia dos Módulos, enfim temos várias atividades em parceria, o que
muito me honra.” (veja aqui a
entrevista)
Especificamente a respeito do Direito
Constitucional, no entanto, essa parceria parece que já foi rompida, porque o
Professor Sylvio Motta publicou, recentemente, na Série Provas e Concursos da
Campus, um outro Curso
de Direito Constitucional, este em parceria com o Professor Gustavo Barchet,
que é mais acadêmico e eminentemente teórico, não possuindo questões ao término
de cada unidade, como na obra anterior, escrita em parceria com o Professor
William Douglas, que é, aliás, muito didática, e eu costumo recomendar aos meus
alunos.
Mas o
Professor William Douglas é também empresário, nessa área editorial e de
concursos públicos, porque coordena, juntamente com o Professor Sylvio Motta, a
Editora Impetus e a Companhia dos Módulos, especializada em concursos públicos
(veja aqui).
Esta pequena digressão se justifica pela
necessidade de que se saiba que o autor daquele artigo que ora pretendo refutar
está de várias maneiras vinculado ao tema da inconstitucionalidade do Exame de
Ordem da OAB, ou seja: (1) como juiz federal, ele poderia ser chamado a decidir
a esse respeito; (2) como professor de Direito da Universo, ele está sendo
indiretamente avaliado, também, juntamente com os seus ex-alunos, pela OAB; (3)
como empresário, professor de cursinho e autor de obras específicas destinadas
a concursos públicos e ao Exame da OAB, ele tem todo o interesse em que o Exame
seja mantido.
Não quero com isso dizer que o Dr. William Douglas
teve um interesse puramente mercantilista, quando decidiu contestar a Decisão
de sua colega, a Juíza Federal Dra. Maria Amélia Almeida Senos de Carvalho,
titular da 23ª Vara Federal do Rio de Janeiro, que havia concedido um Mandado
de Segurança contra a OAB/RJ, fundado na inconstitucionalidade da exigência do
Exame de Ordem, para a inscrição dos bacharéis em seus quadros (veja a Sentença),
mas é importante que se saiba que o Dr. William Douglas é também juiz federal,
desde 1.993, sendo hoje titular da 4ª Vara Federal, de Niterói, no Rio de
Janeiro, e que ele leciona, conforme já referido, no Curso de Direito da
Universo, de Niterói. Ou seja, ele avalia e aprova, como professor
universitário, esses mesmos bacharéis que compram os seus livros e se
matriculam também em seus cursos preparatórios, e são depois novamente
avaliados e reprovados (87,77%) pela OAB, sob o fundamento de que não possuem o
mínimo de qualificação exigida para o exercício da advocacia, conforme veremos
a seguir.
3. As
restrições do Exame e do fechamento de vagas nos cursos de Direito
A média nacional de reprovação no Exame da OAB
costuma ficar nos 80%. Apenas como exemplo, podemos citar o resultado do último
Exame, em São Paulo, no qual apenas 13,61% dos candidatos foram aprovados, o
que significa que 16.390 bacharéis foram reprovados pela OAB, e estarão
impedidos de advogar. (veja aqui a
notícia)
Evidentemente, algumas instituições conseguem aprovar
50%, ou mais, notadamente as públicas, que contam com uma grande concorrência
em relação às suas vagas, o que permite que tenham um corpo discente mais
qualificado para os futuros estudos jurídicos.
Um bom exemplo é o da Universidade de Brasília -
UNB, que é, aliás, a responsável pela realização do Exame da OAB, em todo o
Brasil, com exceção apenas de Minas Gerais, através do seu CESPE – Centro de
Seleção e Promoção de Eventos -, e que aprovou 94% de seus ex-alunos na
primeira fase do último Exame. (veja aqui)
Esse resultado, em grande parte, na minha opinião,
resulta da grande procura pelas vagas do Curso de Direito da UNB. No segundo
vestibular de 2.009, são 32 candidatos por vaga (confira), o
que permite uma boa seleção desses candidatos. O contrário, infelizmente, ocorre,
devido ao baixo poder aquisitivo do brasileiro, com muitas instituições
privadas, que costumam ter um candidato para duas vagas!!
Ressalte-se, ainda, que o Brasil tem apenas 11% dos
jovens com possibilidade de acesso ao ensino superior, o que nos coloca em pé
de igualdade, no fundo do poço, com o Haiti, por exemplo, enquanto a Argentina
tem 30% e os países civilizados – Europa, Canadá, Estados Unidos – têm 60% ou
70%.
Mesmo assim, os dirigentes da OAB estão preocupados
em barrar o acesso dos novos bacharéis ao mercado de trabalho, através do Exame
de Ordem e, também, através do impedimento da abertura de novos cursos de
Direito e do fechamento de muitos dos já existentes. Em setembro do ano
passado, devido à pressão dos dirigentes da OAB, o MEC fechou 54% das vagas oferecidas
pelos cursos de Direito. (veja aqui)
Por uma extraordinária coincidência, o ‘site’ da
OAB federal publicou hoje um editorial referente ao Exame de Ordem, criticando
a proposta que tramita no Senado Federal, destinada a extinguir esse Exame e
tentando justificar a sua importância. Em sua conclusão, esse editorial elogiou
”a iniciativa do presidente da OAB em estimular que os estudantes de Direito,
que receberam ensino de má qualidade, recorram à Justiça para que sejam
ressarcidos com matrícula e mensalidades pagas às instituições, pelo tempo que
frequentaram os cursos. Podem alegar que caíram em uma armadilha puramente
mercantilista.” (veja aqui o Editorial)
Essa “iniciativa” do ilustre Presidente da OAB
suscita, é claro, alguns questionamentos e algumas conclusões:
(1)
Os bacharéis formados pelos 87 cursos de Direito
recomendados pela OAB (veja aqui) e reprovados
no Exame de Ordem deveriam acionar também a OAB, porque acreditaram naquela
recomendação e depois verificaram que “caíram em uma armadilha puramente
mercantilista”?
(2)
Os bacharéis reprovados no Exame de Ordem deveriam
também acionar os seus professores, que os avaliaram durante todo o curso e os
aprovaram, enganando assim esses acadêmicos, que estavam recebendo “ensino de
má qualidade”, sem saberem que não teriam a necessária qualificação para o
exercício da advocacia?
(3)
Não é um absurdo permitir que esses acadêmicos
estudem durante cinco anos, a maioria deles pagando altíssimas mensalidades em
instituições privadas – apenas 20% do ensino superior é público e gratuito -,
muitos deles recorrendo a financiamentos para o pagamento dessas mensalidades,
para que depois 80% deles, em todo o Brasil, sejam reprovados pela OAB e
impedidos de exercer a advocacia?
(4)
Não é absurdo que o Congresso Nacional tenha
aprovado, em 1.994, o Exame de Ordem, constante do art. 8º do anteprojeto do
Estatuto, elaborado pela própria OAB, apenas para os bacharéis em Direito?
(5)
Como seria possível dizer que esse Exame é
constitucional, quando ele trata dessa maneira apenas os bacharéis em Direito,
sem que exista qualquer razão para isso?
(6)
Será que o princípio da igualdade poderia permitir
essa discriminação?
(7)
Afinal de contas, o próprio Congresso Nacional
entende que o médico “sem qualificação” é muito mais perigoso para a sociedade
do que o advogado sem qualificação. Basta que se saiba que o exercício ilegal
da medicina – e também da odontologia e da farmácia - é crime, mas o exercício ilegal da advocacia –
e de todas as outras profissões – é apenas uma contravenção.
(8)
Claro que não pretendo que continuem sendo formados
bacharéis sem qualificação, mas o Exame de Ordem deve acabar, por uma razão
muito simples e imperiosa: ele é inconstitucional, e ninguém mais tem dúvidas a
respeito disso.
(9)
Afinal de contas, qualquer estudante de segundo ano
de um curso de Direito de média qualidade tem a obrigação de saber que uma lei
que atente contra o princípio constitucional da isonomia não pode prevalecer.
Essa lei deve ser considerada nula e de nenhum efeito, e qualquer juiz tem a
obrigação de aplicar ao caso concreto a Constituição, e não essa lei.
(10) Em lugar
do Exame de Ordem deve ser criado um outro Exame, feito pelo MEC, que tem
competência constitucional para isso, e esse Exame – ou Exames – deve ser feito
durante o Curso, e não somente depois da diplomação, como esse absurdo do Exame
da OAB, que rasga o diploma de milhões de bacharéis e rasga também a cláusula
pétrea da liberdade de exercício profissional e a Constituição Brasileira de
1.988.
4. Os argumentos do Dr. William Douglas
Pela leitura cuidadosa do artigo do
Dr. William Douglas, pode-se dizer, em suma, que ele se limitou a contestar os
argumentos constantes da Decisão da MMa. Juíza Dra. Maria Amélia, sem estudar
em profundidade o assunto e sem contestar qualquer dos três argumentos básicos
da inconstitucionalidade do Exame: o desrespeito à isonomia, a
inconstitucionalidade material e a inconstitucionalidade formal. Assim, o Dr.
William Douglas utilizou, apenas, o mesmo argumento básico de todos os
defensores do Exame da OAB, ou seja, o de que ele é necessário, devido à
proliferação dos cursos jurídicos de baixa qualidade. Conveniente, segundo ele,
para o interesse público. Inconveniente, é claro, para os quatro milhões de
bacharéis que os dirigentes da OAB já disseram que foram reprovados no Exame.
Inconveniente, também, na minha opinião, para a imagem da OAB, que deveria
defender a Constituição, antes de se preocupar com o mercado de trabalho dos
advogados já inscritos e com os seus interesses corporativos.
É claro que existem cursos jurídicos de baixa
qualidade – e tantos outros, de medicina, engenharia, administração, etc. -,
mas é evidente que se o Exame da OAB é inconstitucional, a proliferação dos
cursos de baixa qualidade não poderia torná-lo necessário, ou conveniente, ou,
como afirma o Dr. William Douglas, “na pior das hipóteses, o menor dos males”.
4.2. A respeito da eventual qualidade deficiente do
Exame, citada pela MMa. Juíza, diz o Dr. William Douglas: “No
que tange ao Exame da OAB, o grande número de reprovados não é resultado de má
avaliação, ou rigor excessivo, mas de má formação originária dos candidatos e
da leniência excessiva por parte das instituições de ensino. Se estas não zelam
por seus nomes nem respeitam a sociedade, igual atitude não está sendo adotada
pela OAB.”
Refutação:
Pois muito bem, concordo. Concedo que não exista rigor excessivo e que, se
fossem submetidos a esse mesmo Exame os 600 mil advogados inscritos na OAB, os
membros do Ministério Público e das Defensorias, os advogados públicos, os
magistrados e os conselheiros da OAB, todos eles seriam aprovados. Aceitemos
que isso seja verdade, apenas “ad argumentandum”. Mas de quem é a culpa, então?
Dos bacharéis, que estudaram cinco anos e foram aprovados “pela leniência
excessiva das instituições de ensino”, como afirma o autor? Ou do Ministério da
Educação, das instituições de ensino e dos professores de Direito? Qual a razão
para que somente os bacharéis em Direito sejam penalizados, depois de cinco
anos de estudo, inúmeras avaliações e depois da defesa de um Trabalho de
Conclusão de Curso?
4.3.
Quanto ao terceiro
argumento da MMa. Juíza, de que a OAB não é instituição de ensino, diz o Dr.
William Douglas que compete à OAB, apenas, “verificar se o
cidadão que apresenta o diploma está, de fato, capacitado para exercer a
advocacia.” Diz ele, ainda, que o ideal seria “que as instituições de ensino só
concedessem o diploma a quem realmente está bem formado, situação ideal onde
estaria capacitado para exercer quaisquer das funções típicas de um bacharel.
Mas não podemos fechar os olhos à realidade: não é isso o que acontece todos os
semestres. O que é público e notório, circunstância que dispensa até mesmo a
apresentação de provas, é um verdadeiro deságue de bacharéis extremamente mal
formados, deficientes em um grau que beira o desesperador.”
Refutação:
É verdade, concordo, a situação é às vezes desesperadora, e eu sei
perfeitamente disso, porque comecei a lecionar no ano do AI-5, na Universidade
Federal do Pará, e hoje leciono em instituições privadas, mas isso não
transfere à OAB a competência do poder público para a fiscalização e a
avaliação do ensino. A OAB deveria exigir que o MEC desempenhasse corretamente
as suas atribuições, e não apenas em relação aos cursos de Direito. É um
absurdo dizer que, se o MEC não desempenha corretamente as suas atribuições, a
OAB tem que avaliar os bacharéis já diplomados por uma instituição de ensino
superior, fiscalizada e avaliada pelo MEC. Nunca se ouviu dizer que,
juridicamente, as competências possam ser transferidas, devido ao desempenho
deficiente de qualquer órgão público.
Será
que o Dr. William Douglas concordaria, por exemplo, se a OAB resolvesse agora
invadir, também, as competências do Judiciário, para resolver o problema da sua
morosidade? Talvez designando, quem sabe, dois ou três de seus conselheiros,
para auxiliar algum magistrado, que por acaso tivesse milhares de processos
retidos em suas estantes?
Ou,
quem sabe, contratando empresas de segurança, para auxiliar o trabalho das
polícias, no combate à criminalidade? Se a polícia não faz, a OAB tem a
obrigação de fazer? Que raciocínio é esse?
É um
absurdo, também, comparar o Exame do OAB com os concursos públicos, porque a
profissão liberal do bacharel em Direito é a advocacia, e não se pode admitir
que exista a fixação de um número de vagas qualquer, nos quadros da OAB. A
liberdade de exercício profissional é cláusula pétrea, não convém esquecer. Eu
já li, recentemente, em um desses blogs, a opinião de um advogado, dizendo que
as nossas faculdades são faculdades de direito e não de advocacia, ou seja,
elas formam bacharéis e não advogados.
É
claro que elas formam bacharéis, que depois de inscritos na OAB ficam
autorizados a advogar, sujeitos à fiscalização do exercício profissional, essa
que é a verdadeira competência da OAB. O bacharel inscrito na OAB recebe a
carteira vermelha de advogado. Ele é um advogado. Mas o Exame não pode ser
exigido, para que o bacharel se inscreva na OAB, porque a OAB não tem
competência para avaliar a qualificação profissional dos bacharéis. Muito
simples.
Ruy
Barbosa, aliás, recebeu o seu diploma em 1.870, da Faculdade de Direito de São
Paulo e passou imediatamente a advogar, porque naquela época não existia a OAB,
para que ele se inscrevesse, nem muito menos o Exame da OAB, para avaliar a sua
qualificação.
Seria
possível deduzir, portanto, que a Faculdade de Direito de São Paulo era uma
Faculdade de Advocacia, mas hoje perdeu esse “status” e passou a formar apenas
bacharéis, que não têm uma profissão liberal e não servem para nada, se não
forem aprovados em um concurso público ou no Exame da OAB? Que absurdo!
Mais
absurda ainda é a comparação do Exame da OAB com o exame de motorista, quando o
Dr. William Douglas diz: “Aliás, o DETRAN examina a acuidade visual e o
conhecimento mínimo da legislação de transito antes de conceder uma carteira de
habilitação. Não vemos nenhuma diferença ontológica entre uma atividade e
outra.”
Como,
Dr., não existe nenhuma diferença ontológica? O Detran não é um órgão de
classe, mas um órgão do Estado, da administração direta. A OAB, ao contrário, no entendimento mais
recente do Supremo Tribunal Federal, não é nem uma autarquia. Nem uma autarquia
especial, como se dizia anteriormente.
Se o
Exame de Ordem fosse feito pelo poder público, Dr., ele não seria
inconstitucional, mas se a carteira de habilitação dependesse de uma avaliação
feita pelo sindicato dos motoristas, por exemplo, que teria todo o interesse em
reduzir a concorrência, teríamos aí uma inconstitucionalidade, certamente. Além
disso, o candidato a motorista, reprovado pelo Detran, não possui um diploma,
de uma instituição de ensino superior, fiscalizada e avaliada pelo MEC. Claro
que existem diferenças, todas as diferenças.
Não
quero com isso dizer que se o Exame da OAB fosse feito pelo poder público ele
seria perfeito, maravilhoso, acima de qualquer suspeita. Na verdade, ele
estaria sujeito a todos os problemas, e até mesmo às fraudes, que costumam ocorrer
em qualquer concurso público e em qualquer procedimento fiscalizatório
realizado pelo poder público. A própria
OAB, com o seu Exame de Ordem, não escapou dessa pecha, com as inúmeras
denúncias de fraudes, em Brasília, Goiânia, São Paulo, etc.
6. O Exame da OAB, um mensurador externo
da qualidade das instituições
Após
criticar os argumentos da MM. Juíza Maria Amélia, o Dr. William Douglas passou
a comentar alguns resultados práticos do Exame da OAB: (1) os acadêmicos de
Direito passaram a ter maior responsabilidade com a sua formação; (2) os alunos
estudam mais, e exigem aulas melhores; (3) Os professores mais dedicados estão
se preparando e preparando seus alunos para os exames futuros; (4) as
instituições de ensino também estão exercendo uma maior pressão pela qualidade
da aula, para que possam competir em um mercado altamente agressivo; (5) O
Exame da OAB é “um importante instrumento de estímulo, seleção, comparação
entre instituições e melhoria da qualidade geral do ensino jurídico.”
Pois
bem, concordo em parte, e gostaria de lembrar, ainda, que não se pode desprezar
o ensino médio e o fundamental. As instituições de ensino superior não podem
fazer milagres, com muitos dos alunos que ingressam (não deveriam ingressar?)
em seus cursos.
O
Brasil precisa investir em educação. Sem isso, não haverá possibilidade de
desenvolvimento e de redução das desigualdades sociais, que são objetivos
fundamentais proclamados pela Constituição. Todos sabem disso, mas não custa
transcrever: “O Direito à
Educação é um direito humano fundamental e ocupa um lugar
central nos Direitos Humanos e é
essencial e indispensável para o exercício de todos os outros direitos humanos e para o desenvolvimento. Como
um direito de empoderamento, a educação é o veículo principal pelo qual,
adultos e crianças marginalizadas economicamente e socialmente podem se livrar
da pobreza e obter meios para participar integralmente de suas comunidades.
Nenhum dos direitos civis, políticos,
econômicos e sociais podem ser praticados por indivíduos, a não ser que tenham
recebido o mínimo de educação.” (veja aqui)
Todo
brasileiro tem direito a uma educação de qualidade e a iguais oportunidades de
acesso ao ensino superior. Não é possível que o Brasil continue disputando com
o Haiti a pior posição, nesse indicador do desenvolvimento de um país. Não é
possível fechar cursos superiores. É preciso aumentar o número de vagas no
ensino público e gratuito. É preciso dar todas as condições a esses cursos
superiores, públicos ou privados, para que o brasileiro tenha o seu direito de
acesso à educação superior de qualidade integralmente efetivado.
No
mais, é preciso dizer que o Exame de Ordem está transformando os cursos
jurídicos em cursinhos preparatórios.
E,
finalmente, é preciso lembrar ao Dr. William Douglas que, apesar de todas essas
virtudes, apesar de todos esses resultados práticos, que ele citou no seu
artigo, o Exame da OAB é inconstitucional e não deveria ser defendido, nem
pelos dirigentes da OAB, nem muito menos por professores universitários. Se ele
é inconstitucional, não pode ser conveniente. Está claro?
Mas o
Dr. William Douglas é professor da Universidade Salgado de Oliveira, em
Niterói. Vejamos, agora: qual será o índice de reprovação de seus ex-alunos no
Exame da OAB?
De
acordo com a própria OAB, no Exame de Ordem 2.008/3, a Universo de Niterói aprovou
apenas 12,23% dos 424 candidatos inscritos, ou seja, apenas 51 candidatos foram
aprovados. (veja aqui)
6. Considerações, ou perguntas, finais
Assim, eu tomaria a liberdade de
perguntar ao Dr. William Douglas:
Como é possível que um professor
de direito defenda essa avaliação posterior, de seus próprios alunos, feita
pela OAB?
Não estaria ele enganando os
seus alunos? Pelo menos, os 373 reprovados nesse Exame da OAB? Quantos desses
candidatos reprovados teriam sido alunos, também, de um dos cursos
preparatórios do Dr. William?
Não estaria o Dr. William Douglas
sendo cúmplice, assim, do “estelionato educacional”, de que falam os dirigentes
da OAB? Ou a culpa é apenas dos acadêmicos e dos bacharéis?
Se os acadêmicos estudaram
durante cinco anos, se eles foram aprovados pelo Dr. William Douglas, e pelos
outros professores, muitos deles dirigentes da OAB, como é possível que depois
esses mesmos professores defendam o Exame de Ordem, como indispensável para
avaliar a qualificação profissional do bacharel em Direito?
Não será esse um atestado de
incompetência desses professores? Estaria errada a avaliação que eles próprios
fizeram? Estariam erradas todas as avaliações realizadas durante os 5 anos do
Curso de Direito? Ou o Exame da OAB é que está errado, exigindo demais, para
fazer reserva de mercado?
Por que será que esses
professores não reprovaram os maus alunos, se é esse o caso, e não deram o
diploma apenas para os alunos realmente qualificados para o exercício da
advocacia?
Verifica-se,
portanto, que não é assim tão fácil defender o Exame da OAB, especialmente
quando se é um professor de Direito, obrigado a participar dessa “pavorosa
encenação”.