O ASSASSINATO DO PROMOTOR
Fernando
Lima
Professor de Direito Constitucional da Unama
26.11.2006
No dia 24.11.2006, o Promotor do Ministério Público
do Estado do Pará, Fabrício Ramos Couto, de 37 anos de idade, foi covardemente
assassinado, com seis tiros, em sua própria sala, no Fórum de Marapanim, a
O criminoso, o advogado João Bosco Guimarães, de 37
anos de idade, estava respondendo a processo por uma tentativa de homicídio,
praticada em 1.998, contra o então Prefeito de Marapanim,
Osmundo Naiff, que recebeu
quatro tiros e ficou paraplégico. O motivo do crime, se é que isso pode ser
chamado de motivo: o Prefeito, ao re-inaugurar uma praça pública de Marapanim, que tinha o nome do pai do criminoso, o
ex-Prefeito Antonio Guimarães, trocou o nome desse logradouro. Um cunhado do
Prefeito, Osmar Carvalho Amaral, também foi ferido pelos disparos do advogado.
Oito anos depois, o advogado/criminoso continuava
advogando, até mesmo em causa própria (!!!) e ameaçando diversas pessoas, o que
demonstrava, claramente, a sua periculosidade. Nem a Justiça, nem a OAB/PA,
tomaram as providências cabíveis, durante esses oito anos, o que terminou
causando a morte do jovem Promotor.
Em nota oficial, a OAB/PA, por seu
Presidente, Ophir Cavalcante Junior, disse que “lamenta
o ocorrido, ressaltando que atitude dessa natureza não se coaduna com a postura
dos advogados paraenses, devendo ser apurada com rigor, a fim de que não mais
se repita. Trata-se de uma atitude isolada que, do ponto de vista da OAB, será
apurada pelo Tribunal de Ética e Disciplina (TED) para penalizar o advogado
pela atitude violadora dos preceitos éticos e disciplinares
a que todos os advogados estão submetidos”.
Pergunta-se,
então: por que somente agora? O que foi feito, pela OAB/PA, a respeito desse
criminoso, durante os oito anos, em que ele continuou advogando, depois da
tentativa de homicídio contra o Prefeito de Marapanim?
Também
em nota oficial, o TJE/PA disse que: “Lamentavelmente, é mais um crime
cometido contra a Justiça
Os
membros do Ministério Público do Estado do Pará, revoltados, exigiram mais
segurança, para o desempenho de suas atribuições, e disseram que a mídia não
deu a devida atenção ao fato, que se constituiu em um verdadeiro atentado
contra o Ministério Público e contra a própria Justiça.
Será
que a vida de um Promotor de Justiça, que foi morto dentro do Fórum, no desempenho
de suas atribuições, apenas para exemplificar, vale menos do que a vida da
americana Dorothy Stang,
cujo assassinato causou enorme repercussão nacional e internacional, e levou o
Governo e a Justiça paraenses a montarem uma verdadeira “operação de emergência”,
para julgar o criminoso em tempo record??
Esse assassinato reabriu a polêmica a respeito da
segurança nos prédios da Justiça. A Seccional da OAB/PA sempre foi contrária à
instalação das portas giratórias e dos dispositivos de segurança, que poderiam
evitar que alguém ingressasse nesses prédios, portando armas. A OAB costuma
alegar que isso impediria o livre acesso dos advogados, atentando contra as
suas prerrogativas profissionais e contra a dignidade profissional da
categoria.
Há mais de três anos, o autor publicou
o artigo “As Portas do TRT”, referente à instalação
de portas de segurança no Tribunal Regional do Trabalho da Oitava Região.
Posteriormente, acabaram prevalecendo as imposições da
OAB/PA, porque os advogados passaram a dispor de uma entrada especial, sem o
dispositivo de segurança.
Leia, a seguir, o artigo “O ASSASSINATO DO PROMOTOR”.
Como é possível que alguém ingresse,
livremente, armado de dois revólveres, no Fórum da Comarca de Marapanim, para covardemente assassinar um Promotor de
Justiça, que estava no pleno exercício de suas funções, a serviço do Estado do
Pará?
Como aceitar as declarações do
criminoso, em rede nacional de televisão, dizendo que decidiu matar o Promotor
apenas para ficar preso durante algum tempo, porque o morto ficaria preso para
sempre, em baixo da terra?
Como aceitar as suas declarações, de
que “o Promotor deveria respeitar homem”? Como é possível que ele ainda pense
que é um homem?
Como se admite que um marginal desses
tenha conseguido obter um diploma de bacharel em direito e tenha conseguido a
sua inscrição na OAB, como advogado?
Por que esse criminoso ainda estava em
liberdade, se em 1998 já havia tentado matar o Prefeito de Marapanim,
por motivo fútil, apenas porque este havia mudado o nome de uma praça pública,
que tinha, antes, o nome de um ex-Prefeito, o infeliz que gerou e criou esse
monstro?
Por que esse criminoso ainda estava em
liberdade, se o Prefeito de Marapanim ficou paraplégico,
em decorrência desse atentado, ocorrido há oito anos?
Como é possível que esse criminoso
ainda estivesse advogando?
Como se pode admitir, também – o
cúmulo do absurdo -, que um criminoso de alta periculosidade, como esse,
estivesse advogando em causa própria, para que pudesse esconder os autos de seu
próprio crime, e para diariamente ameaçar a Juíza e o Promotor da Comarca de Marapanim?
Como se pode admitir tanta impunidade,
tanta hipocrisia, tanta insegurança?
Como se pode admitir tanta irresponsabilidade das
autoridades competentes?
Por que não havia, no Fórum de Marapanim, ao menos, um policial militar, que pudesse defender
a Magistrada e o Promotor? Um policial corajoso que, no estrito cumprimento do
dever legal, pudesse ter a enorme felicidade de nos livrar, definitivamente,
desse monstro?
Por que somente agora, de acordo com
as declarações da OAB, essa “atitude isolada (...) será apurada
pelo Tribunal de Ética e Disciplina (TED) para penalizar o advogado pela
atitude violadora dos preceitos éticos e
disciplinares a que todos os advogados estão submetidos”?
Como é
possível que o Presidente da OAB tenha dito que “apesar do criminoso já responder a processo por tentativa de
homicídio, não havia nada que desabonasse a conduta de João Bosco Guimarães
quanto (sic) advogado”?
Será que a OAB não deveria se preocupar menos com os
advogados inadimplentes, que ficam impedidos de advogar apenas porque deixaram
de pagar as suas anuidades, ou com o seu inconstitucional Exame de Ordem, que
impede o exercício da advocacia pelos novos bacharéis, formados pelas nossas
instituições de ensino jurídico, para se concentrar na verdadeira fiscalização
da ética profissional e para afastar da advocacia os que atentam contra os
clientes, contra a Justiça e contra a Sociedade?
Como é possível que a insegurança das
ruas se estenda à própria Casa da Justiça, atingindo a todos que ali trabalham,
em defesa da Sociedade: aos magistrados, aos promotores, aos advogados e aos
serventuários?
Por que os dirigentes da OAB têm a coragem
de dizer que não podem ser instaladas portas de segurança, nos prédios da
Justiça?
Será que os advogados não se podem
sujeitar, no seu próprio interesse, a todo e qualquer dispositivo eletrônico,
ou procedimento de revista, que seja necessário para evitar que o crime
prevaleça?
Qual pode ser a razão para que, até mesmo
nos presídios, a OAB se oponha a esses dispositivos e
à revista, que poderiam evitar que os presos recebessem celulares, drogas ou
armas, e que também serviriam, no mínimo, para que ninguém pudesse desconfiar da
cumplicidade dos advogados?
Se, em qualquer estabelecimento
bancário, as pessoas são obrigadas a passar pelo detector de metais, por que
somente nos prédios do Judiciário seria diferente?
Se qualquer mortal precisa estar
sujeito a essas exigências, em benefício de sua própria segurança, por que
somente os advogados devem ser especiais e intocáveis?
Por que ninguém acreditou, quando eu
escrevi, em 2003, que: “A instalação das portas de segurança do TRT não atenta,
absolutamente, contra os direitos do advogado, previstos no art. 7º da Lei
8906/94 (Estatuto da Advocacia). É verdade que, de acordo com esse Estatuto, o
advogado pode ingressar livremente (art. 7º, VI, c) em qualquer edifício ou
recinto em que funcione repartição judicial, assim como ele também pode
ingressar livremente nas delegacias e nos presídios (art. 7º, VI, b), mas isso
não significa que ele não esteja sujeito às necessárias medidas de segurança.
Se assim não fosse, qualquer advogado – e infelizmente podem existir advogados
loucos ou bandidos, como em qualquer outra profissão - poderia ingressar
Por que não pode prevalecer, nunca, o
interesse público?
Aliás, por falar em interesse público,
em República e em igualdade, por que será que os advogados - e qualquer pessoa
de “nível superior” -, têm direito à prisão especial? Por que esse privilégio?
Será que esse criminoso, sabendo que
seria jogado, juntamente com os pobres, em um presídio qualquer, onde poderia
ser morto ou espancado, não pensaria duas vezes, antes de cometer essa
estupidez?
Como esconder tanta revolta?
É preciso dar, agora, à família do
Promotor assassinado, a devida reparação. Seria isso possível?