O advogado no divórcio consensual

Benedito Wilson

25.02.2007

No início deste ano, foi editada a Lei nº 11.441, que, dentre outras previsões, possibilita a realização de separação e divórcio consensuais por via administrativa. De acordo com a lei, não será mais necessário o ajuizamento de ações para homologação de separações e divórcios consensuais, desde que o casal não possua filhos menores ou incapazes. Os interessados poderão simplesmente registrar em cartório de notas a separação ou divórcio, em escritura onde definirão a partilha de bens, se houver, a pensão alimentícia e a volta ao uso do nome de solteiro por um dos cônjuges.

Esse procedimento deixa ao Poder Judiciário a incumbência de processar apenas as ações de separação e divórcio litigiosos e aquelas em que o casal possua filhos menores. Nessas hipóteses, convém que as ações permaneçam sob a tutela judicial, no primeiro caso para que se resolva o conflito entre as partes, e no segundo para definição da guarda e em proteção aos direitos e interesses do menor.

Assim, o objetivo da lei foi tornar mais célere e menos burocrática a separação e o divórcio, facilitando a vida dos interessados, além de reduzir o número de ações na Justiça, já assoberbada de processos para apreciação. No primeiro momento, deu-se uma situação insólita, logo superada: a lei estava em vigor, mas os cartórios não sabiam como cumpri-la.

Temia-se, ainda, o elevado custo do procedimento traçado na nova lei, logo contornado em nosso Estado. A escritura e demais atos notariais serão gratuitos aos comprovadamente pobres. Apesar das aparentes vantagens, uma parcela de magistrados criticou a nova lei. Essas reações já eram esperadas. No meio jurídico, diz-se que 'competência é poder', ou seja, quanto mais atribuições tiver o Poder Judiciário, mais forte politicamente ele será. Por isso, não surpreende que haja alguma reação de juízes, em que pese a diminuição potencial das ações a serem submetidas a seu crivo e a mais rápida entrega da justiça que poderá advir desse fato.

Não convence a alegação de que, frente ao juiz, o casal será melhor aconselhado e assistido. Na prática, não é assim que as coisas se passam. Quem já passou pela experiência de separar-se ou divorciar-se consensualmente percebeu que muitas vezes o casal visualiza o juiz, mas sua ação resume-se em questionar o casal sobre a impossibilidade de retomada da vida conjugal. Em seguida à negativa dos cônjuges, é lavrada a ata, sem outras considerações. Assim é feito não por desídia ou descaso do juiz, mas porque a experiência indica que, em juízo, o casal realmente apenas quer a rápida solução de sua situação, sem maiores delongas.

Na tramitação do projeto de lei, no Congresso Nacional, originalmente se previa ser facultativa a assistência de advogado. A intervenção da OAB no processo legislativo foi responsável pela alteração da proposta original, de maneira que a nova lei exige a participação do advogado nos casos por ela tratados. Com o que ouso discordar.

O advogado é essencial à administração da justiça. E cabe reconhecer seu imprescindível papel junto ao Poder Judiciário, na defesa dos direitos e garantias do cidadão. Todavia, a exigência de sua participação nos procedimentos em análise parece descabida, vez que a nova lei cuida justamente de imprimir às ações de divórcio e separação consensual maior agilidade, tornando-a menos formal. Nesse contexto, seria mais razoável, na forma do projeto original, que a assistência por advogado fosse facultativa, e não obrigatória.

O argumento da necessidade de um profissional especializado para proteger os direitos do casal e verificar a regularidade do teor da escritura sucumbe ante à realidade. A singeleza das hipóteses abarcadas pela nova lei não permite maior campo para a assistência jurídica: as partes não terão nenhuma discordância quanto à divisão de bens, nem filhos menores para se definir a guarda.

Verifica-se nos cartórios, após a edição da nova lei, o casal se fazer acompanhar de um advogado amigo de ambos, que até ali se dirige apenas para assinar a escritura, sem nenhuma outra participação. É o retrato pronto e acabado da desnecessidade de sua presença, obrigatória por força de um corporativismo arcaico. Por vez, a assistência por advogado representará, nesses casos, o maior custo para o casal. É previsível que esse ônus econômico faça com que casais de menor renda, dispensados pela lei do pagamento das taxas notariais, deixem de fazer uso desse benefício legal. Ora, se o objetivo da lei é suprimir burocracia no procedimento de separação - tanto é que dispensou a presença do juiz de direito e do promotor de justiça -, a obrigatoriedade da assistência por advogado foi um retrocesso e um descabido desprestígio à própria lei.