Controle Judicial Preventivo de Constitucionalidade...

Vicente Paulo (19.04.2002)

 

 

Extraído da página:

http://www.vemconcursos.com/opiniao/index.phtml?page_ordem=recentes&page_id=507

 

Se por um lado temos questões de concursos que merecem nosso mais alto repúdio, existem outras que são dignas de elogios e elogios. E o Cespe/Unb, com o devido respeito às demais bancas examinadoras, têm dado um show em termos de qualidade de suas provas.

 

Não é por outro motivo que eu recomendo sempre em sala de aula a resolução de mais e mais exercícios de provas realizadas pelo Cespe/Unb, pois elas funcionam como um excelente meio de revisão do conteúdo teórico e, por serem do tipo "certo ou errado", auxiliam muito na identificação dos detalhes do Direito Constitucional.

 

É o caso, por exemplo, da seguinte assertiva sobre controle de constitucionalidade do último concurso de Procurador Federal, realizado no início deste mês (certa ou errada):

 

"O sistema brasileiro de controle de constitucionalidade é muito rico, uma vez que contempla, simultaneamente, meios de controle difuso e concentrado, bem como mecanismos de controle preventivo e repressivo; no controle preventivo, porém, não é possível, por meio de ação judicial, impedir o poder legislativo de deliberar acerca de determinadas matérias".

 

A assertiva está falsa, mas isso é o menos importante nessa história. Importante mesmo é a quantidade de informações que ela traz em seu bojo, e que você precisa saber para resolver outras questões de Direito Constitucional.

 

Vejamos, separadamente, as informações implícitas nessa assertiva:

 

1ª parte: o nosso sistema de controle de constitucionalidade, de fato, é muito rico, contemplando tanto o controle difuso (suscitado por qualquer pessoa num caso concreto e submetido à apreciação de qualquer juiz ou tribunal do País, com o objeto de afastar a aplicação da lei às partes do processo), quanto o controle concentrado, realizado em ações próprias (ADIn, ADECON e ADPF), originariamente no órgão de cúpula do Poder Judiciário (STF ou TJ), em que um dos legitimados pela Constituição busca expelir do ordenamento jurídico uma lei ou ato normativo inconstitucional (ou confirmar a sua constitucionalidade, pois as ações são dotadas de natureza dúplice ou ambivalente);

 

2ª Parte: além da riqueza do nosso controle de constitucionalidade judicial, é bom lembrar que outros Poderes da República também realizam fiscalização da constitucionalidade das leis: o Chefe do Executivo, no momento do veto, realiza fiscalização preventiva da constitucionalidade do projeto de lei; a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Congresso Nacional, ao apreciar as proposições a ela submetidas também controla preventivamente a constitucionalidade; o Chefe do Executivo, ao afastar a aplicação de uma lei que ele entenda inconstitucional no seu território (medida admitida pela jurisprudência do STF), também está realizando a fiscalização da constitucionalidade das leis; os tribunais de contas também possuem competência para, no exercício de suas atribuições, fiscalizar a constitucionalidade das leis.

 

Como se vê, temos entre essas hipóteses controle de constitucionalidade preventivo (veto por inconstitucionalidade, atuação da CCJ) e repressivo (negação à execução da lei pelo Chefe do Executivo, atuação dos tribunais de contas);

 

3ª Parte: e o controle judicial, como atua no nosso País? Só de maneira repressiva ou há hipótese de controle preventivo?

 

A regra, sem dúvida, é a atuação a posteriori do Poder Judiciário, consubstanciando o chamado controle repressivo. Significa dizer que o Poder Judiciário fiscaliza a constitucionalidade da lei depois dela estar pronta, acabada, publicada, inserida no ordenamento jurídico. O Poder Judiciário não tem por competência ficar, no seu dia a dia, fiscalizando a constitucionalidade dos projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional. Primeiro a lei é elaborada, publicada, e, depois, quando provocado, o Poder Judiciário apreciará sua conformidade (ou não) com a Constituição. Essa é a regra do controle judicial no nosso País.

 

Entretanto, a assertiva está falsa porque, excepcionalmente, admite a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a fiscalização judicial preventiva do processo legislativo, desde que no âmbito do controle difuso ou incidental (via mandado de segurança).

 

É o caso, por exemplo, de estar em trâmite no Congresso Nacional uma proposta de emenda à Constituição que afronte cláusula pétrea. Diante desse fato, o STF admite o controle judicial preventivo de constitucionalidade, pois, nessa hipótese, segundo o tribunal, o próprio processo legislativo já afronta diretamente a Constituição Federal.

 

Aliás, vale lembrar que o legislador constituinte, ao estabelecer as cláusulas pétreas (CF, art. 60, § 4º), foi incisivo, prescrevendo que "não será objeto de deliberação", deixando claro que uma PEC que afronte cláusula pétrea não deve, sequer, ser levada à deliberação!

 

Finalizando, mais dois comentários sobre esse controle judicial preventivo de constitucionalidade:

 

a.        cuida-se de controle incidental ou difuso, exercido por meio da impetração de mandado de segurança; não existe controle preventivo mediante ação direta de inconstitucionalidade (ADIn) no direito brasileiro; a ADIn tem por objeto retirar do ordenamento jurídico uma lei ou ato normativo que afronte a Constituição; logo, o ajuizamento de uma ADIn pressupõe uma norma pronta e acabada, já publicada, inserida no ordenamento jurídico;

 

b.       não é qualquer pessoa que poderá dar início a esse controle judicial preventivo de constitucionalidade (controle do processo legislativo que afronte a Constituição); somente os participantes do processo legislativo (partidos políticos, congressistas etc.) poderão impetrar o mandado de segurança com essa finalidade, uma vez que o direito líquido e certo a ser defendido no mandamus será o de não participar de uma deliberação que afronte flagrantemente a Constituição.

 

 

Quantas informações numa só assertiva, que qualidade de questão! Mais uma vez, os parabéns para o competente examinador do Cespe/Unb!

Até a próxima semana.

 

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