Fernando Machado
da Silva Lima
03.04.2000
Não existe tributo mais injusto do que a CPMF, cuja alíquota
única incide até mesmo sobre a operação bancária de retirada dos proventos de
qualquer velhinha aposentada.
Mas em relação ao IPTU de Belém, e à Taxa de Limpeza
Pública, que é cobrada no mesmo carnê, e que vêm sendo discutidos há mais de
dois meses, em decorrência do recadastramento, e da conseqüente atualização do
valor venal e da metragem dos imóveis, o debate que era eminentemente jurídico,
tendo em vista a pacífica jurisprudência do STF, tem sido levado, agora, para a
abordagem dos temas da justiça social e da capacidade contributiva. Diz o
defensor das alíquotas progressivas, porque sobre as Taxas não apresentou até
esta data qualquer argumento, que o IPTU deve ter caráter pessoal e as
alíquotas deverão ser maiores, se o valor do imóvel é maior.
A Prefeitura de Belém se gabou, em várias peças
publicitárias, de ter o IPTU mais barato do Brasil. Em uma delas, publicada na
Província, a notícia informa que o Dieese comprovou que Belém tem uma das
alíquotas mais baixas do País, se comparadas com as de outras capitais. Informa
ainda, essa propaganda, que a partir deste ano a isenção atinge imóveis de até
9.000 Ufir, aumentando para 81.000 o número de imóveis isentos.
Sinceramente,
não acredito que o Dieese, que é um órgão sério, tenha realmente concluído que
o nosso IPTU é o mais barato do Brasil, apenas levando em conta as alíquotas.
Qualquer pessoa medianamente inteligente entenderá que pelo menos três
variáveis deveriam ser consideradas, ou seja, as alíquotas, o valor venal do
imóvel, e o nível de atividade econômica. A alíquota nada significa, para
efeito de comparação, sem o valor venal do imóvel. Talvez por essa razão, em
São Paulo, que segundo a notícia, tem alíquotas mais altas do que as de Belém,
um apartamento com 55 m2, na Rua São Vicente de Paulo, recebeu uma cobrança de
IPTU no valor de apenas R$18,40 (anual), conforme xerox em meu poder.
Mas
além desses dois parâmetros, o das alíquotas e o dos critérios utilizados para
a fixação do valor venal, a pesquisa do Dieese precisaria levar em
consideração, também, a real capacidade contributiva, em cada uma das Cidades
pesquisadas. Isso é evidente, também, porque o tributo que pode ser considerado
baixo, ou justo, em uma Cidade econômicamente viável, onde os contribuintes têm
empregos, pode ser que em Belém seja confiscatório.
A
Secretária de Finanças afirmou, em texto publicado na Província, que “a receita anual do IPTU mais taxas agregadas tem se situado em torno
de R$27 milhões, ou seja, 35% do valor lançado, absolutamente insuficiente e
muito aquém da capacidade de contribuir de nosso cidadão”. Para justificar
essa afirmativa, citou a pesquisa do Dieese, acima comentada.
Na
verdade, parece muita estranha essa afirmativa, partindo de uma economista, que
não pode desconhecer os inúmeros fatores que devem ter causado esses altos
níveis de inadimplência.
Ou
será que o contribuinte não paga, apenas porque não gosta de pagar?
Será
que deixa deliberadamente de pagar seu imposto, apenas porque pretende
prejudicar o Governo?
Observe-se
que essa inadimplência, de 65%, já existia antes mesmo do Cadastro
Multifinalitário, e antes mesmo do início da campanha na qual, segundo a
Secretária, pessoas irresponsáveis começaram a divulgar informações inverídicas, para confundir a
opinião pública, no interesse de grupos políticos minoritários que buscam
destruir o Governo.
O contribuinte é
obrigado a fornecer os meios, através dos tributos, para as despesas da
administração, em seus três níveis, federal, estadual e municipal.
Não existe mais qualquer dúvida de que a carga tributária
brasileira, hoje na faixa dos 31%, está muito acima de seu limite físico. Seria
o caso, talvez, de que algum órgão econômico competente e responsável estudasse
o assunto, para verificar, no caso específico de Belém, se realmente a carga
tributária é baixa, como afirma a Secretária, e se o contribuinte (65%) não
paga seu imposto apenas porque não quer.
A Secretária se queixa de que, “após os repasses federais e estaduais de receitas, previstos na
Constituição Federal, os Municípios ficam com apenas 17% dos recursos públicos,
enquanto os Estados ficam com 23% e a União com 60%”. Reclama, ainda,
contra o Governo do Estado, que “através
de reduções arbitrárias e sistemáticas, realizadas ao arrepio da Constituição e
da legislação federal, retirou do Município de Belém R$60,40 milhões, no
período de 97 a 99, e deverá em 2000 retirar mais R$42,48 milhões”.
Mas será que a solução é realmente, como afirma a
Secretária, a criação de mais duas Varas específicas para os feitos da Fazenda
Pública? Será que a inadimplência, de
65%, deverá ser reduzida através de decisões judiciais com a celeridade e os
efeitos punitivos devidos, como ela pretende? Ou será que o excesso de carga
tributária é que pode explicar a inadimplência, a redução da atividade
econômica, e o aumento da economia informal?
Em muitas outras cidades brasileiras, a capacidade contributiva
da sociedade é maior do que em Belém, e o universo de contribuintes sendo
maior, todos contribuem um pouco, e os impostos não pesam muito para cada
cidadão. Belém tem 81.000 imóveis isentos de IPTU, mas isso não é nenhum favor.
Denota apenas a pobreza da cidade e a baixa capacidade contributiva, que leva a
uma alta concentração da carga tributária. Especialistas em tributação calculam
que, se a carga global no Brasil é de 31%, para quem paga imposto mesmo, ela é
superior a 60% do PIB. E em Belém, qual seria essa carga real?
Finalizando, desejo esclarecer, mais uma vez, que nunca
afirmei que as alíquotas progressivas foram criadas pelo atual Governo. Sei
perfeitamente que elas já existem há mais de uma década, isso a progressividade
em função do valor venal do imóvel, porque a seletividade, em função do uso do
imóvel, também julgada inconstitucional pelo Supremo, já existe há mais de
vinte anos.
Infelizmente, Dra. Secretária, não posso
concordar com a afirmativa de que a progressividade em Belém é legítima, tendo
em vista a tradição, ou seja, o histórico que demonstra que essa
progressividade é antiga. Não posso concordar, porque esse fato é desprovido de
qualquer relevância jurídica. O costume, no caso a cobrança que vinha sendo
feita, não pode prevalecer contra a lei, no caso a Lei Fundamental, isto é, a
Constituição.
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