O EXAME DE ORDEM
Francisco
Tavares Noronha Neto
Sumário: 1.
Introdução; 2. Exame de Ordem X Princípio da Dignidade; 3. Exame de Ordem X
Princípio da Igualdade; 4. Exame de Ordem X Livre exercício das profissões; 5.
Exame de Ordem X Direito à Vida; 6. Conclusão; 7. Bibliografia.
1.
Introdução
A
Constituição Federal é a lei fundamental e suprema do Estado brasileiro. É dela
que deriva toda autoridade. Somente ela delega poderes e competências
políticas. Todas as outras formas pertencentes ao ordenamento jurídico nacional
só têm validade se estiverem em conformidade com as suas.
“Nem o governo federal, nem os governos dos
Estados, nem os dos Municípios ou do Distrito Federal são soberanos, porque
todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivas daquela
lei fundamental. Exercem suas atribuições nos termos nela estabelecidos”[1]
A supremacia constitucional
exige que todos os fatos jurídicos estejam de acordo com os preceitos da
Constituição Federal, de modo que a produção de atos legislativos ou
administrativos contrários a princípios ou normas constitucionais enseja o que
se chama “inconstitucionalidade”.
“Essa
incompatibilidade vertical de normas inferiores (leis, decretos, etc.) com a
Constituição é o que, tecnicamente, se chama inconstitucionalidade das leis ou dos atos do Poder Público, e que
se manifesta sob dois aspectos: (a) formalmente,
quando tais normas são formadas por autoridades incompetentes ou em desacordo
com formalidades ou procedimentos estabelecidos pela Constituição; (b) materialmente,
quando o conteúdo de tais leis ou atos contraria preceito ou princípio da
Constituição.”[2]
Com o advento da Lei nº
8.906/94, por meio de disposição expressa em seu art. 8º, foram estabelecidos
requisitos mínimos para que possa ser efetuada a inscrição de um advogado. De
acordo com a lei, devem ser requeridos: capacidade civil; diploma ou certidão
de graduação em direito, obtida em instituição de ensino oficialmente
autorizada e credenciada; título de eleitor e quitação do serviço militar;
aprovação em Exame de Ordem; não exercer o requerente
atividade incompatível com a advocacia; idoneidade moral; e prestar
compromisso perante o conselho.
Este
dispositivo legal tem servido de fundamento para que seja impedido de trabalhar
o profissional que está legitimamente habilitado desde o reconhecimento da sua
profissão, consumado na colação de grau proclamada pelo Reitor da Universidade,
detentor exclusivo de tal prerrogativa.
Além de contribuir para o
aumento do desemprego no Brasil, o artigo supramencionado afronta os princípios
constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade, o livre exercício
das profissões e o direito à vida, conforme será demonstrado nos capítulos que
seguem. Visto que contraria preceitos contidos na Carta Magna, a exigência do
“Exame de Ordem” constitui inconstitucionalidade material.
“Essa
incompatibilidade não pode perdurar, porque contrasta com o princípio da
coerência e harmonia das normas do ordenamento jurídico,
entendido, por isso mesmo, como reunião de normas vinculadas entre si
por uma fundamentação unitária.”[3]
2. Exame de Ordem X Princípio da Dignidade
Nosso
suor sagrado é bem melhor do que esse sangue amargo.
Renato Russo
Estatui a Carta Magna em vigor,
em seu art. 1º, incisos III e IV, in verbis:
“Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em
Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III- a
dignidade da pessoa humana;
IV- os
valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;”
“O
ser humano, o homem, seja de qual origem for, sem discriminação de raça, sexo,
religião, convicção política ou filosófica, tem direito a ser tratado pelos
semelhantes como “pessoa humana”, fundando-se o atual
Estado de direito em vários atributos, entre os quais se inclui a “dignidade”
do homem, repelido, assim, como aviltante e merecedor de combate qualquer tipo
de comportamento que atente contra esse apanágio do homem. Sob dois ângulos,
pelo menos, o trabalho pode ser apreciado: pelo individual (“o trabalho
dignifica o homem”) e pelo social, afirmando-se, em ambos os casos, como valor
que na escalonação axiológica se situa em lugar
privilegiado. Dignificando a pessoa humana, o trabalho tem valor social dos
mais relevantes, pelo que a atual Constituição o coloca como um dos pilares da
democracia.” [4]
Observe-se o que
diz o art. 170 da Constituição Federal, in
verbis:
“170-
a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,
tem por fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social, observando os seguintes princípios:...”
Não há dúvidas
quanto ao fato de que, na sociedade atual, trabalho e dignidade são conceitos
intimamente relacionados. Digno é o ser humano que trabalha.
“O
trabalho é inseparável do homem, da pessoa humana, confunde-se com a própria
personalidade, em qualquer de suas manifestações. Pode-se dizer dele, como já
lembrou alguém, a mesma coisa que dizia Bossuet da
religião em seu aspecto moral: ‘é o todo do homem’.”[5]
Desde os tempos
remotos, o trabalho está relacionado à vida do homem. A Bíblia diz que “Deus
tomou o homem e o pôs no jardim para o lavrar e guardar” (Gn
2.15). Era o princípio do trabalho, um privilégio somente concedido à espécie
humana.
A maldição pelo
pecado não foi o trabalho, mas a fadiga: “do suor do teu rosto comerás o teu
pão” (Gn. 3.19). O trabalho, pelo contrário, é um dom
sagrado que não pode ser negado ao homem. É componente indispensável de sua dignidade.
O sábio Rei Salomão apontava o trabalho diligente como requisito para uma vida
digna, observando que o não trabalhar conduz o homem a uma vida de penúria e
carestia, a uma condição socialmente reprovável, em que até motivação para sair
da cama lhe falta: “Em todo trabalho há proveito” (Pv.
14.23).
“Vai
ter com a formiga, ó preguiçoso; olha para os seus caminhos e sê sábio! Ela não
tem superior, nem oficial, nem dominador, contudo no verão prepara o seu pão e
na sega ajunta o seu mantimento. Ó preguiçoso, até quando ficarás deitado?
Quando te levantarás do teu sono? Um pouco para dormir, um pouco para
toscanejar, um pouco para cruzar as mãos em repouso; assim te sobrevirá a tua
pobreza como um ladrão e a tua necessidadae como um
homem armado.” (Pv. 6.6-11)
Jesus, certa vez,
disse: ...”digno é o
trabalhador...” (Mt. 10.10).
Já no século
XVIII, Voltaire afirmava: “o trabalho afasta de nós três grandes males: o
tédio, o vício e a necessidade”.
Ainda que se possa
afirmar que as práticas da Idade Antiga tenham tornado o trabalho algo
indesejável, este modo de pensar não mais predomina nos dias atuais.
“De
malvisto e malquisto, na Antiguidade, [o trabalho] ganhou influxo dignificante
com o Cristianismo, acabando por atingir o valor máximo no Renascimento, com o
destino do homem voltado para a vida, para as conquistas, para a ação.”
Com
o Humanismo e a Reforma, cada um devia seguir sua livre vocação, procurando
desenvolvê-la para seu bem e da própria sociedade, como dizia o Calvinismo:
todos devem trabalhar, mesmo o rico, porque o trabalho é o serviço de Deus. Daí
o novo tipo do homem moderno, fáustico: ativo,
voluntarioso, austero, voltado para o trabalho. Não ter um ofício é que passou
a ser vergonhoso.”[6]
Negar, ao homem, o
direito de trabalhar, é expô-lo aos três grandes males
citados pelo filósofo francês. É impedi-lo de exercer o serviço de Deus. É
negar-lhe a dignidade. Ao impedir o bacharel em Direito de exercer a sua
profissão, a exigência de aprovação em Exame de Ordem fere os incisos III e IV
do art. 10 da Constituição Federal.
3. Exame de Ordem X Princípio da Igualdade
Estatui o art. 5º,
caput, da Carta Política em vigor, in verbis:
“art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:....”
A igualdade é um
tema que pouco merece discussões. É um dos principais ícones da democracia. Por
ela, são vedados quaisquer privilégios ou distinções que um regime,
simplesmente liberal, poderia tolerar. Por isso, a Constituição Federal
brasileira abre o capítulo dos direitos individuais com a determinação de que
todos são iguais perante a lei sem
distinção de qualquer natureza.
Isto significa que
condições equivalentes devem receber igual tratamento. Sexo, raça, trabalho,
credo religioso e convicções políticas são diferenças individuais que,
entretanto, não colocam os indivíduos em condições diferenciadas. “Esses
fatores continuam a ser encarecidos como possíveis
fontes de discriminações odiosas e, por isso, desde logo, proibidas
expressamente.” [7]
Para que possa
clinicar, o bacharel em medicina se dirige ao Conselho Regional de Medicina a
fim de fazer a sua inscrição. O mesmo ocorre a dentistas, engenheiros,
arquitetos, químicos, veterinários, administradores, economistas,
farmacêuticos, entre outros profissionais: o reconhecimento da profissão se
exaure na colação de grau que lhes é proclamada pelo reitor da Universidade. Só
resta aos conselhos regionais e federais o dever de exercer controle sobre o
profissional já reconhecido, zelando pela ética e observando os possíveis
prejuízos sociais decorrentes de seu mau procedimento.
O bacharel em
Direito, de modo diverso, não pode simplesmente dirigir-se a uma seção da Ordem
dos Advogados do Brasil e solicitar sua inscrição. O grau que lhe foi conferido
não é considerado suficiente para o reconhecimento de sua profissão, sendo-lhe
imposto o ônus de realizar um exame. Embora tenha recebido o grau de bacharel
como os demais profissionais, o tratamento que recebe é diferente,
discriminatório.
Vale observar que
o princípio da igualdade pode ser violado de duas maneiras, conforme observa
José Afonso da Silva:
“Há duas formas de cometer essa inconstitucionalidade. Uma
consiste em outorgar benefício legítimo a pessoas ou grupos, discriminando-os
em detrimento de outras pessoas ou grupos em igual situação. Nesse caso, não se
estendeu às pessoas ou grupos discriminados o mesmo tratamento dado aos outros.
O ato é inconstitucional, sem dúvida, porque feriu o princípio da isonomia...
A
outra forma de inconstitucionalidade revela-se em impor obrigação, dever, ônus,
sanção ou qualquer sacrifício a pessoas ou grupos de pessoas, discriminando-os
em face de outros na mesma situação que, assim, permaneceram em condições mais
favoráveis. O ato é inconstitucional por fazer discriminação não autorizada
entre pessoas em situação de igualdade. Mas aqui, ao contrário, a solução da
desigualdade de tratamento não está em estender a situação jurídica detrimentosa a todos, pois não é constitucionalmente
admissível impor constrangimentos por essa via.”[8]
É nesta segunda
forma de inconstitucionalidade que se enquadra a exigência de aprovação em
Exame de Ordem para o exercício da advocacia.
4. Exame de Ordem X Livre exercício das
profissões
Estatui a
Constituição Federal em seu art. 5º, inciso XIII, in verbis:
“XIII
– é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer.”
Ao profissional
qualificado, nenhuma restrição deve ser imposta quanto ao exercício de seu
ofício. Observe-se que o texto constitucional utiliza a expressão
“qualificações que a lei estabelecer” e não “exames estabelecidos em lei”.
A qualificação
profissional se dá por meio das instituições de ensino reconhecidas pelo Poder
Público. A educação, e não um exame ou teste, é a única fonte geradora de
qualificação profissional. Observe-se o disposto no art. 205 da Constituição
Federal, in verbis:
“art. 205 – A educação, direito de todos e dever do Estado e
da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho.”
O art. 205 complementar o inciso XIII do art. 5º da Constituição
Federal, esclarecendo o real significado da expressão “qualificações
profissionais”. Conforme o texto constitucional, a educação é indispensável ao exercício
laboral.
Do mesmo modo,
dispõe a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96) em seu art. 2º,
sobre o sentido do que vem a ser qualificação profissional, in verbis:
“art. 2º - A educação, dever da família e do Estado,
inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem
por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”
A qualificação
profissional para o exercício da advocacia é adquirida através do aprendizado
em cursos específicos e outorgada, na forma da legislação vigente, pelo reitor
de cada universidade. Nenhuma outra instituição, além das universidades, tem
competência para qualificar os bacharéis ao exercício de suas profissões.
“A
universidade, por expressa delegação do poder público (art. 207 da CF/88 e Lei 9.394/96, art. 53, VI), detém a prerrogativa
legal de outorgar ao aluno o diploma de Bacharel em Direito. Essa formalidade
de outorga de grau é pública e solene, proclamada pelo Reitor, que, neste ato,
representa o Chefe de Estado, Sua Excelência o Presidente da República, com as
seguintes palavras: “Estais, de agora em diante,
habilitado e qualificado para o exercício de vossa profissão.”
Em face disto, invade a Ordem dos Advogados a esfera de competência das
universidades, pois somente a elas foi delegado o poder de habilitar e
qualificar seus bacharéis para o exercício de sua faina.”[9]
A tese de que, por
exercer função essencial à Justiça, o advogado deve ter sido submetido a um
Exame de Ordem, a fim de que a sociedade seja resguardada de eventuais danos
causados por maus profissionais é inócua. Se o bacharel colou grau e a
faculdade lhe outorgou o título correspondente, ninguém, incluindo a OAB, tem
poderes para negar a qualificação profissional que já foi adquirida.
Neste sentido, já
existe jurisprudência. Observe-se o trecho da sentença proferida pelo Dr.
Carlos Humberto de Souza, Juiz Federal da 3ª Vara da Seção Judiciária de Goiás
– Proc. 96.10250-3:
“A
qualificação profissional do bacharel em direito exaure-se, na atual conjuntura
jurídico-constitucional, na outorga do grau de bacharel em Direito, com a
respectiva entrega do diploma, que produz efeitos jurídicos segundo as leis do
país. Cabe à OAB, simplesmente, respeitar a referida outorga e o diploma.
Continuo afirmando: se o curso foi bem ou mal feito, isso não interessa à OAB.
Num segundo momento, ou seja, da inscrição do bacharel em Direito nos quadros
da OAB, e daí em diante, cabe à própria OAB, e a mais ninguém, exercer todos os
atos de controle do exercício profissional.”
“É
óbvio que determinadas atividades ligadas à medicina, à engenharia, nas suas
diversas modalidades, ao Direito, poderão ser geradoras de grandes malefícios,
quer quanto aos danos materiais, quer quanto à liberdade e quer ainda quanto à
saúde do ente humano. Nestes casos, a exigência de cumprimento de cursos
específicos se impõe como uma garantia oferecida à sociedade... A atual redação
deste artigo deixa claro que o papel da lei na criação de requisitos para o
exercício da profissão há de ater-se exclusivamente às qualificações
profissionais. Trata-se, portanto, de um problema de capacitação, técnica,
científica ou moral.”[10]
É a formação de
nível superior, e não o Exame de Ordem, que capacita o educando para o
exercício de sua profissão. Observe-se o que diz o art. 43, caput e inciso II
da Lei 9.394/96, in verbis:
“Art.
43 – A educação superior tem por finalidade:
II
– formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção
em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade
brasileira e colaborar na sua formação contínua;...”
Observe-se também
que o diploma de curso superior já comprova a qualificação profissional
recebida, dispensando qualquer outro meio de auferir tais qualificações,
conforme se pode perceber pela leitura do art. 48 da supracitada lei, in verbis:
“Art.
48 – Os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão
validade nacional como prova da formação recebida por seu titular.”
Assim, “o
exercício da advocacia exige, como condição sine qua non, a
conclusão do curso de Direito, satisfeitas as exigências legais, pertinentes ao
término do 2º grau ou equivalente, vestibular, matrícula, grade curricular, formatura
e colação de grau.”[11] Qualquer outro requisito que a lei impuser
será inconstitucional.
5. Exame de Ordem X Direito à Vida
O fruto do
trabalho é mais que sagrado
Milton
Nascimento e Beto Guedes
Consagra a
Constituição Federal o direito à vida, in
verbis:
“Art.
5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, e à
propriedade, nos termos seguintes:...”
O ‘direito à vida’
é o primeiro dos direitos invioláveis assegurados pela Constituição. ‘Direito à
vida’ é expressão que tem, no mínimo, dois sentidos: (a) o direito de continuar
vivo, embora se esteja com saúde e (b) ‘o direito de subsistência’; o primeiro,
ligado à segurança física da pessoa humana, quanto a agentes humanos ou não,
que possam ameaçar-lhe a existência; o segundo, ligado ao ‘direito de prover a
própria existência, mediante trabalho honesto’. O trabalho, como meio de
subsistência, é poder-dever do Estado, que deve protegê-lo, assegurando-lhe
condições necessárias para concretizar-se.”[12]
O direito à vida e
o direito ao trabalho que gera renda e promove a subsistência do trabalhador e
de sua família são dois aspectos de um mesmo objeto. Qualquer ato que atente
contra o trabalho atenta contra a vida e, portanto, é inconstitucional.
6. Conclusão
Demonstrada a
inequívoca inconstitucionalidade do art. 8º da Lei nº 8.906/94, que instituiu o
Exame de Ordem, não se pode entender por que a OAB, defensora da Constituição e
da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos, da
justiça social e da boa aplicação das leis, tem acatado a tese inconstitucional
de que tem legitimidade para aferir e referendar a capacidade profissional do
bacharel em Direito.
O Exame de Ordem
afronta os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da
igualdade, o livre exercício das profissões e o direito à vida, além de atrasar
e dificultar a entrada do jovem no mercado de trabalho,
podendo causar danos irreversíveis, visto que o tempo é um bem
irrecuperável e, uma vez perdido, torna-se impossível o retorno ao “status quo ante”.
Por isso, tal
inconstitucionalidade não pode persistir. O legislador cometeu um grande
equívoco, o que não significa que houve intenção de ferir a Constituição, nem
de prejudicar alguém ou algum grupo.
A existência de
erros na legislação é bastante natural, uma vez que a história dos homens
corresponde à história dos erros humanos. Desde Adão, os homens têm cometido
falhas e infringido as normas superiores, ainda que involuntariamente. O que
não se pode admitir é que, uma vez identificado o erro, não se o corrija.
Vale lembrar que
trabalhar para corrigir os erros do legislador, sanar as inconstitucionalidades
e defender o Estado Democrático de Direito é dever de cada cidadão,
independentemente do cargo que ocupe, ou da função social que exerça. Como, em
1888, afirmou Rudolf Von Ihering:
“O Direito é um trabalho incessante, não somente dos poderes públicos, mas
ainda de uma nação inteira.”[13]
O desenvolvimento
real do Brasil, enquanto nação comprometida com o bem estar social e com a
manutenção da democracia somente poderá ser obtido por meio da cooperação e
combinação dos esforços de todos os membros da comunidade brasileira. Por isso,
é preciso a união de todos no combate ao Exame de Ordem e a outras
inconstitucionalidades que promovem a injustiça e violentam o Estado
Democrático de Direito.
7.
Bibliografia
BASTOS,
Celso
Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. V. 2.
São Paulo: Saraiva, 1989.
CRETELLA Júnior. Comentáarios à Constituição de 1988. v.
1. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992.
IHERING, Rudolf Von. A Luta pelo Direito. Rio de Janeiro: Forense,
1999.
MORAES FILHO,
Evaristo de. Introdução ao Direito do Trabalho, 7ª ed. rev. e atual. São Paulo:
LTR, 1995.
SILVA, José Afonso
da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed. São Paulo: Malheiros,
1997.
[1] Silva, José
Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed. São Paulo:
Malheiros, 1997, p.49.
[2] Silva, José
Afonso da. Ob. cit., p.50.
[3] Silva, José
Afonso da. Ob. cit., p. 51.
[4] Cretella Jr, J.
Comentários à Constituição de 1988. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p.
139-140.
[5] Filho, Evaristo
de Moraes. Introdução ao Direito do Trabalho. 7ª ed. rev. e atual. São Paulo:
LTR, 1995. p. 30.
[6] Filho, Evaristo
de Moraes. Ob. Cit., p. 34-35.
[7] Silva, José
Afonso da. Ob. Cit., p. 217-218.
[8] Silva, José
Afonso da. Ob. Cit., p. 222-223.
[9] Trecho da
entrevista do Dr. Habib Tamer Badião, professor de
Direito e História, publicada na Revista Consulex nº
1, de 31.01.97.
[10] Bastos, Celso
Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil, 2 vols.
São Paulo: Saraiva, 1989, p. 78.
[11] Trecho de
sentença exarada pelo Dr. Carlos Humberto de Souza, Juiz Federal da 3ª Vara da
Seção Judiciária de Goiás – Proc. 96.10250-3.
[12] Junior, Cretella. Comentários à Constituição de 1988, vol. I. 3ª ed. Rio de Janeiro. Ed. Forense Universitária.
1992. p. 183.
[13] Ihering, Rudolf Von. A Luta pelo Direito. Rio da
Janeiro: Forense, 1999. p. 1.