12.04.2005
O Diário
do Pará, do último dia 12, noticiou que o Presidente da Câmara dos Deputados,
Severino Cavalcante, quando participou da posse de seu filho, nomeado para uma
Superintendência em Pernambuco, voltou a defender o nepotismo, dizendo que
“Essa história de nepotismo é coisa para fracassados e derrotados, que não
souberam criar seus filhos. Eu criei bem os meus filhos, que têm universidade,
e agora estou indicando José Maurício. Cargo de confiança é para quem merece
confiança. Para mim, que tenho uma família bem constituída, meus filhos merecem
confiança. Por isso mesmo, eu os escolhi”.
A Ordem
dos Advogados do Brasil, há poucos dias, na reunião do seu Colégio de
Presidentes, realizada em Fortaleza, decidiu lançar uma campanha nacional
contra o nepotismo, coincidentemente, por sugestão do Dr.
Ophir Cavalcante Júnior, Presidente da Seccional do Pará, que já defendeu, há
pouco mais de três anos, o mesmo critério do deputado Severino Cavalcante, para
a caracterização do nepotismo, ou seja, o da ausência de preparo, ou de
competência, para o desempenho do cargo público.
Esse fato ocorreu em janeiro de 2002, quando a
coluna de Cláudio Humberto, que até hoje pode ser lida na internet, no
endereço: http://www.claudiohumberto.com.br/Colunasanteriores/tabid/297/articleType/ArchiveView/month/1/year/2002/day/5/Default.aspx, sob o título “Nepotismo no Voto”, noticiou que: “Na OAB do Pará, o nepotismo triunfa
até nas listas sêxtuplas dos indicados para compor Tribunais Regionais
Federais. Após o precedente da ex-presidente, Avelina Hesketh, cujo marido foi
incluído na lista e virou juiz do TRT da 8ª Região, agora foi a vez de o atual
presidente da Ordem, Ophir Cavalcante Jr, conseguir o mesmo para a irmã Suzy”.
Quatro
dias depois (09.01.2002), em decorrência de resposta recebida do Dr. Ophir, Cláudio Humberto noticiou, sob o título “Méritos
Próprios”, o seguinte: “O presidente da OAB do Pará, Ophir Cavalcante Jr., diz
que se retirou do processo de escolha da lista para o quinto constitucional do
Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região, e que sua irmã, Suzy Cavalcante
Koury, foi escolhida por unanimidade sem a sua interferência e pelos próprios
méritos. Ela é doutora em Direito e procuradora concursada”. Esta notícia pode
ser lida em: http://www.claudiohumberto.com.br/Colunasanteriores/tabid/297/articleType/ArchiveView/month/1/year/2002/day/9/Default.aspx.
Não resta dúvida, portanto, de que ambos, o
Presidente da Câmara e o da OAB/PA, entendem que o verdadeiro nepotismo precisa
ser prejudicial ao interesse público e que o parente pode ser nomeado, desde
que seja competente e honesto. A questão é polêmica, mas é evidente o conflito
entre o princípio constitucional da impessoalidade e a confiança, que se exige
para esses cargos. Infelizmente, o problema da utilização dos cargos públicos
de confiança, com outros objetivos, para privilegiar outros interesses,
contrários ao interesse público, é bem antigo, no Brasil. O nosso regime
político, dito democrático, nunca foi, na realidade,
puramente representativo, mas sim essencialmente cooptativo. Os governantes
utilizam, em seus jogos de poder, para citar Rui Barbosa, “a administração, a
fazenda, o orçamento, ou o erário, de cujos peitos se dependuram, aos milhares,
as crias vorazes na mamadura..”, criando assim um abismo entre o tecido social
e o poder, fazendo com que o cidadão não tenha capacidade de participar nas
decisões políticas, nem de fiscalizar os atos dos governantes.
Na minha
opinião, porém, a campanha da OAB está inteiramente equivocada, porque se
preocupa apenas com as relações de parentesco, esquecendo completamente outros
interesses, que também podem levar à nomeação de pessoas incompetentes para
cargos de confiança na administração pública, como os interesses políticos,
econômicos, partidários, as amizades antigas, etc.
Dessa forma, independentemente de qualquer
relação de parentesco, os cargos de confiança costumam ser
preenchidos, também, por pessoas incompetentes, pelo simples fato de que
a nomeação dessas pessoas possa atender aos interesses do partido político, ou
de uma Igreja, ou de uma corporação, ou de que ela possa garantir, até mesmo, a
quem as nomeia, o indispensável apoio da mídia.
As
relações de parentesco não constituem, portanto, obviamente, a única razão
possível, para que o interesse particular, ou de um grupo, pretenda sobrepujar
o interesse público. O problema não é, apenas, o nepotismo, como pretende a
OAB. Existem inúmeras outras práticas contrárias à democracia, à efetividade
constitucional e à garantia dos direitos fundamentais, que sempre
caracterizaram – as práticas, claro – a nossa política, os nossos governantes e
as nossas elites. Essas práticas são conhecidas como: clientelismo,
corporativismo, fisiologismo, populismo, elitismo, patrimonialismo,
cartorialismo, coronelismo, favoritismo, empreguismo, caciquismo, personalismo,
apadrinhamento, corrupção, propinas, lobby.
Não devem ser esquecidas, também, algumas expressões: emendas de bancada,
tráfico de influência, doações de campanha, driblar a lei, cooptação política,
patrimonialismo burocrático, autoritarismo militar, etc...
Essas
práticas todas constituem, na verdade, a chave de nossa organização política,
porque é em torno delas que se desenvolve, no dia a dia, a atuação do governo,
ensejando a corrupção, a inefetividade da Constituição, a ilegalidade, o
autoritarismo, o exercício discricionário do poder, a injustiça e a impunidade.
Recentemente, a imprensa noticiou a existência de mais de 40 mil cargos de confiança,
que são preenchidos não por parentes, mas pelos “companheiros”.
No Brasil,
quem usa a venda é o povo, e não a Justiça. No Brasil, prevalecem a esperteza e
a hipocrisia, em detrimento da inteligência e da honestidade.
Em suma:
nem o nepotismo é o único mal que nos aflige, e nem toda nomeação de parente
deve ser censurada. Se assim fosse, Deus não escaparia da pecha, porque, para
salvar a humanidade, somente conseguiu confiar em seu próprio filho.
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