GRITANDO EM SILÊNCIO - O CLAMOR DE 157 MIL BACHARÉIS EM DIREITO PELO FIM DO EXAME DE ORDEM DA OAB

REYNALDO ARANTES

Bacharel em Direito pela Unoeste de Presidente Prudente/SP e Presidente Nacional em exercício da OABB/MNBD

E-mail: mnbd.brasil@gmail.com

               

                       Em 1984, um filme inglês sobre a guerra do Camboja tinha o título: Os gritos do silêncio.  Versava sobre um povo submetido a crueldades sem fim.

                       No mês de junho de 2010, a Agência Senado promoveu mais uma enquete em seu site: “Você é contra ou a favor da proposta que acaba com o exame de ordem, como requisito para o exercício da advocacia ? (PLS 186/2006).

                       A resposta a favor do projeto foi um grito silencioso de 157.849 cidadãos brasileiros ou 94,32% de 167.355 participantes da enquete... Um sussurro de 5,68% ou 9.507 contrários ao projeto e favoráveis ao exame de ordem demonstrou de forma cabal que, mesmo entre os advogados inscritos na OAB, ser favorável ao exame é posição de uma minoria, quiçá de seus líderes apenas...

                         Estes votos representam manifestação de uma parcela da população brasileira que conhece os detalhes e meandros do exame de ordem aplicado pela OAB. A grande maioria da sociedade está cega sobre o assunto, já que o discurso oficial da OAB – necessidade de seleção dos profissionais e a má formação universitária dos bacharéis – é uma mentira que vem sendo incutida no consciente coletivo nacional há mais de uma década.

                       É muito importante destacar que o Projeto de Lei do Senado 186/2006 de autoria do Senador Gilvam Borges (PMDB/AP) que acaba com o exame de ordem aplicado pela OAB, está tramitando junto com o PLS 043/2009 de autoria do Senador Marcelo Crivella (PRB/RJ) que prevê exames para TODOS os cursos de nível superior no país, mas aplicados pelo MEC, como obrigação da União, acrescentando tal determinação ao Art. 9 da Lei 9.394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, que regulamenta o Art. 205 e seguintes da Constituição Federal.

                       Os bacharéis em Direito não são contra a existência de um exame que faça a aferição de conhecimento acadêmico ao término da faculdade, afinal, na faculdade passamos por exames a cada dois meses... O que somos contrários por ser inconstitucional – formal e materialmente – é a aplicação de um exame por parte da OAB, do Conselho formado por profissionais da área que dizem quem pode ou não lhes fazer concorrência, isto sem contar a parte jurídica onde “exame’ não pode impedir exercício profissional (art. 5º, inciso XIII da Constituição), sendo que apenas falta de “Qualificação definida em lei” tem esta capacidade. E “Qualificação” é fornecida apenas pela Educação (Art. 205 da Constituição) que é ministrada pelas faculdades e não pela OAB que não gerencia, ao menos, 01 (uma) única faculdade sequer...        

                       Assim, o grito silencioso de 157.849 votantes na enquete da Agência Senado contra o exame de ordem aplicado pela OAB é o reflexo de uma gigantesca parcela da sociedade brasileira impedida criminosamente de trabalhar, de ganhar seu pão com o conhecimento que adquiriu, de complementar o conhecimento teórico com a prática do exercício de sua profissão, de fazer valer a Constituição em defesa de seu direito adquirido com o recebimento de um diploma válido...

                       Será que ninguém se pergunta o porquê das faculdades formarem bons profissionais em jornalismo, administração, psicologia, pedagogia, etc, e não em Direito?

                       Será que a sociedade não observa que reprovação de 90% dos participantes de cada exame de ordem só interessa à OAB que cobra R$ 200,00 de cada participante a cada exame e aos cursinhos que cobram mensalidades mais caras que as faculdades para “prepararem” os bacharéis para este exame inconstitucional?

                       Com média de 25 mil candidatos a cada exame, só o Estado de São Paulo gera 5 milhões de reais a cada 4 meses !!! E quanto é gerado para os Cursinhos “preparatórios” para o exame OAB ???

                       É bom lembrar que o exame de ordem – criado em 1.963 pela Lei. 4.215/63 – era uma alternativa a quem não podia fazer o estágio de prática jurídica e administração forense, um estágio de 2 anos que atualmente é feito por todos os Bacharéis em Direito.

                       O exame só passou a ser usado como “funil” pela OAB, depois que o Presidente Fernando Collor desburocratizou o ensino superior no Brasil. E a OAB – que viu a concorrência que seria gerada no futuro e quis fazer uma reserva de mercado preventiva para não perder status de profissão de “doutores” – não conseguiu na primeira tentativa emplacar o exame restritivo.

                       Na mensagem de veto presidencial nº 736 de abril de 1.992, o Presidente da República explanava:

Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do parágrafo 1° do artigo 66 da Constituição Federal, decidi vetar integralmente, por considerá-lo contrário ao interesse público, o Projeto de Lei n° 201, de 1991 (n° 92/90 no Senado Federal), que "Altera a Lei n° 4.215, de 27 de abril de 1963, e torna obrigatório o Exame de Ordem para admissão no quadro de advogados".

                       E complementava:

Ademais disso, questionam profissionais do Direito o adequado aprestamento técnico-jurídico dos advogados indicados por algumas Seccionais da OAB para elaborar o exame e avaliar os estudantes, no cotejo com professores universitários habituados a essa tarefa.”

                       Mesmo vetada, 2 anos depois, o Presidente Itamar Franco sancionava a lei 8.906/94 que criou esta mesma reserva de mercado ilegal e imoral e ainda permitiu que a regulamentação da lei (lei 8.906/94, art. 8º, §1º) fosse feita pelo Conselho Federal da OAB, em total dissonância com o Art. 84, inciso IV da Constituição.

                       Desde 1.996 quando entrou em vigor até os dias de hoje, o exame de ordem cumpriu seu papel de fazer reserva de mercado. Segundo números da OAB, o Brasil tem 600 mil advogados inscritos e 3,5 milhões de bacharéis impedidos criminosamente de trabalhar. Os inscritos seguem sendo “doutores”, pois se fossemos 4 milhões seriamos todos “operários” da Justiça, sendo acessíveis a todas as camadas sociais a exemplo do que ocorre com os dentistas..

                       Os Bacharéis em Direito impedidos de trabalhar por este exame feito para barrar e não para aferir conhecimento, são profissionais que cursaram 5 anos de faculdade, que têm um diploma válido e expedido por instituição regular autorizada e fiscalizada pelo MEC, a maioria com financiamento universitário a quitar, espoliados com taxas de inscrição absurdas (inscrição para concurso de Juiz Federal custa R$ 120,00 para um cargo que tem rendimentos de 19 mil mensais) e sendo obrigados a fazerem “cursinhos preparatórios” que cobram mais caro que a mensalidade das faculdades, pois não existe matéria acadêmica sobre jurisprudência do tribunal de ética da OAB, por exemplo, mas tal “matéria” existe no exame de ordem, pois como afirmamos, ele é feito para barrar e não para aferir conhecimento...   

                       O Exame de Ordem da OAB existe para criar uma “porteira” que só deixa entrar no mercado menos de 10% dos formandos a cada exame e vai destruindo vidas e pessoas até que elas desistam de fazer concorrência a quem já está no mercado.

                       É importante frisar que a grande maioria dos atuais inscritos NÃO prestou exame de ordem e muitos líderes da OAB – inclusive o Presidente da OAB/SP, Luiz Flávio Borges D’Urso – confessam abertamente que eles próprios não passariam no exame se o prestassem.

                       A enquete realizada pela Agência Senado – séria, restrita a um voto, imparcial – registrou o empenho de membros da Organização dos Acadêmicos e Bacharéis do Brasil (OABB), entidade organizada e legalizada em todo o Brasil (CNPJ 09.582.855/0001-42) que coordena o Movimento Nacional dos Bacharéis em Direito (MNBD) e que divulgou e trabalhou para que os bacharéis em Direito registrassem os 157.849 votos favoráveis à extinção do exame.

                       Os números da votação demonstraram a insatisfação nacional com o inconstitucional exame, sendo a maior votação deste ano, cujo recorde anterior era pouco mais de 9 mil votos na enquete de janeiro (Custeio integral de vale transporte pelo empregador – PLS 228/09).

                       Não há como negar que 157.849 votos a favor do projeto que extingue o exame, contra 9.507 votos dos que não o aprovam, foi um grito silencioso, com vozes de todos os rincões deste país.

                       Vozes que gritaram em apoio ao fim do exame aplicado pela OAB, que apóiam qualquer exame aplicado pelo MEC e que seja para aferir conhecimento jurídico e não para fazer barreira ilegal e imoral a acesso ao mercado de trabalho privado, exercido por autônomo que o mercado deve selecionar após este profissional ter a oportunidade de juntar a prática profissional ao conhecimento teórico que adquiriu nos bancos acadêmicos.

                       A Justiça Federal já se posicionou em 3 estados (RS, GO e RJ) que o exame é inconstitucional. O Supremo Tribunal Federal se prepara para analisar o tema “Exame de Ordem da OAB” após o Ministro Marco Aurélio de Mello definir – e ser apoiado unanimemente por seus pares – que o tema goza de “Repercussão Geral” e deve ser julgado no STF.

                       Importante destacar que a inconstitucionalidade do exame de ordem – violação do art. 5º, inciso XII c/c art. 205, caput (inconstitucionalidade material) e também do art. 84, inciso IV (inconstitucionalidade formal) da Constituição Federal, ainda NÃO foi analisada pela Suprema Corte nacional, responsável pela decisão sobre temas constitucionais. Outros temas referentes ao exame de ordem – inscrição negada a quem se formou antes da vigência da lei e buscou se inscrever depois, mudança de regras para quem já cursava a faculdade, etc – foram julgados, mas a inconstitucionalidade formal e material com os fundamentos acima não.

                       É primordial destacar que as ações judiciais só começaram a chegar a vários tribunais e geraram a análise do STF quanto à Repercussão Geral após o MNBD iniciar sua organização nacional e divulgar uma fundamentação clara e precisa da inconstitucionalidade do exame e possibilitar advogados oriundos do movimento que não têm medo de assinar ações contra a OAB. Até 2006 – 10 anos de vigência da norma inconstitucional – contavam-se nos dedos de uma única mão as ações de inconstitucionalidade do exame...   

                       O Congresso Nacional também busca corrigir esta anomalia constitucional através do PLS 186/06 e 043/09 e ainda da PEC 01/2010 no Senado e dos PLC (projetos de lei da Câmara dos Deputados) 5.801/05 (Max Rosenmann – PMDB/PR), 5.773/06 (José Divino – PMDB/RJ), 2.195/07 (Edson Duarte - PV/BA e 2.426/07 (Jair Bolsonaro – PP/RJ).

                       Outros vários projetos do Senado e da Câmara propõem mudanças na aplicação do exame, pois observam que o mesmo é uma reserva de mercado e gerador de dinheiro apenas, pois ouvem o clamor popular e sentem o “cheiro” de algo errado no ar...                    

                       Saliente-se que a OAB buscou votos entre seus inscritos divulgando a enquete do Senado em seus sites e comunicando por email e pedindo votos contra o projeto. O resultado foi pífio e os líderes da OAB voltaram a exercitar o que têm mais experiência: o lobby político. O registro de entrada do Congresso registrou em junho, várias visitas do Presidente Nacional da OAB à Casa de Leis e a seus membros...

                       A OAB, porém, demonstra não ter votos. Temida por ter acesso à imprensa nacional e por atacar todos os políticos flagrados em mal feitos pela própria imprensa, a OAB pode tirar, mas não acrescenta um voto a nenhum parlamentar, já que seus expoentes buscam votos para seus próprios projetos políticos.

                       Já os bacharéis em Direito buscam quem os defenda e que defenda a Constituição Federal e demonstraram que seu potencial de votos é – segundo a enquete – pelo menos 16,5 vezes maior que o da OAB, apesar de serem – segundo os números da mesma OAB – cerca de 5 vezes maiores em números.  

                       A OABB/MNBD sem ter acesso à mídia tradicional, sem a estrutura da OAB, apenas com o trabalho de seus membros que são insignificantes perto dos inscritos na OAB, obteve um resultado expressivo e que deverá levar a questão “exame de ordem” a ser analisada com outros olhos por parlamentares, imprensa e sociedade em geral.

                       Não pedimos muito, apenas que se cumpra a Lei Maior, que observem os fatos e os números do exame de ordem de maneira mais ampla, mais comparativa, mais detalhada...

                       Todos que freqüentaram salas de aula sabem que, se 10% dos alunos fossem mal em uma prova, eles eram ruins e o professor bom. Mas se 90% dos alunos fossem mal, o professor era ruim ou a prova tinha algo de podre... Apliquem isto na questão exame de ordem da OAB...

                       Nosso grito com 157.849 vozes foi silencioso... Nosso trabalho pelo fim do exame aplicado pela OAB de forma inconstitucional é de formiguinhas. A cada dia novas vozes se juntam e cada dia novas conquistas são obtidas. Por estarmos em um país democrata, é questão de tempo a Constituição ser respeitada e este exame sair das mãos da OAB.

                       Após 5 anos estudando o Direito e agora, tendo como buscá-lo nos tribunais e nos parlamentos de forma organizada, demonstraremos que somos capazes de agir juridicamente e de elegermos quem nos represente.

                       O grito na enquete foi silencioso, mas nossa ação aumenta seu volume a cada dia e a sociedade começa a ouvir nossa verdade, a Justiça começa a nos dar sentenças, o parlamento em breve nos dará leis e em breve o exame de ordem será apenas uma página negra da história, sepultada pela democracia e pelo respeito ao Estado Democrático de Direito.

 

Links de referência do Senado Federal:

- Resultados das enquetes da Agência Senado:

http://www.senado.gov.br/noticias/opiniaoPublica/enquetes.asp

 

-Internauta pode opinar sobre exame da OAB em nova enquete da Agência Senado

http://www.senado.gov.br/noticias/vernoticia.aspx?codNoticia=%20102515&codAplicativo=2

 

- Fim do exame da OAB conta com apoio de internautas, mas divide senadores

http://www.senado.gov.br/noticias/verNoticia.aspx?codNoticia=102989&codAplicativo=2

 

- Ampla maioria dos votos em enquete indica apoio ao fim da prova da OAB

http://www.senado.gov.br/noticias/verNoticia.aspx?codNoticia=103216&codAplicativo=2