EXAME DA OAB: O Manifesto das Faculdades
de Direito de São Paulo
Fernando Lima
Professor de Direito Constitucional
18.08.2011
SUMÁRIO: 1. O Manifesto; 2. Os signatários do Manifesto e os reprovados das
Faculdades de elite; 3. A opinião do Reitor da USP; 4. A opinião de um
Professor da USP; 5. Considerações Finais.
1. O Manifesto
Agora
que o Supremo Tribunal Federal deverá, finalmente, julgar o Exame da OAB,
depois que a Procuradoria Geral da República já opinou pela sua
inconstitucionalidade, estamos chegando ao limite do absurdo. Os interessados
na manutenção desse Exame, em sua defesa, nada mais conseguem – é claro, porque
razões jurídicas não existem - do que dizer, de várias maneiras, que ele seria
necessário, como um filtro, ou uma “porteira mínima”, porque muitos bacharéis
em Direito não sabem ler ou escrever.
O
mais triste é que muitos desses defensores do Exame da OAB são professores de
Direito, Diretores de Faculdades de Direito e até mesmo Reitores de
Universidades conceituadas. Isso é um inominável absurdo, claro.
Como
podem eles dizer que o Exame da OAB é necessário para avaliar os bacharéis em
Direito? E o diploma que essas Faculdades deram – ou será que venderam? – aos
bacharéis, não serve para nada? Se os bacharéis em Direito não sabem ler ou
escrever, por que será que eles conseguiram fazer o Curso de Direito nessas
instituições e receberam os seus diplomas? Apenas para pagar as ricas
mensalidades dessas instituições de ensino superior, e para pagar os salários
de seus professores?
A
última investida dos defensores do Exame da OAB, preocupados, naturalmente, com
a possibilidade de uma derrota no Supremo Tribunal Federal, ocorreu agora, no
dia 3 de agosto, com a publicação do “Manifesto das Faculdades de Direito em
Favor do Exame de Ordem”. (veja
aqui)
Nesse
Manifesto, as mais conceituadas – e mais caras – Faculdades de Direito de São
Paulo dizem, muito sucintamente, apenas, que o Exame da OAB é necessário.
As
melhores Faculdades de Direito de São Paulo – apenas a USP é pública – ou seja,
PUC, USP, Mackenzie, FGV, São Bernardo e São Judas Tadeu, pelos seus Diretores,
que assinam esse Manifesto, dizem que o Exame é necessário, porque “salvaguarda
os cidadãos, titulares de bens jurídicos muitas vezes indisponíveis e caros ao
nosso sistema jurídico, que só poderiam
ser confiados a profissionais tecnicamente qualificados”.
Ora
bolas, perguntar não ofende: e, por acaso, os profissionais que são formados
por essas Faculdades, não deveriam
ser todos eles tecnicamente qualificados para a advocacia? Por que
então eles receberam um diploma de bacharel em Direito? Afinal de contas, para
que servem, mesmo, os cinco anos do Curso, as provas, os estágios, a defesa do
trabalho de conclusão?
Para que
serve o diploma, exatamente? O diploma do bacharel em Direito é um diploma de
bacharel ou um diploma de candidato? Sim, porque se esse bacharel não for
aprovado em um concurso público, ou no Exame da OAB, o seu diploma servirá
apenas para pendurar na parede da sala.
No entanto, de acordo
com o art.
205 da Constituição Federal, a educação qualifica para o trabalho.
E o trabalho do bacharel em Direito, a sua profissão liberal, evidentemente, é
a Advocacia. A sua qualificação para a advocacia decorre da educação, ou seja,
do curso de Direito, que a lei exige, em uma instituição de ensino superior,
autorizada e fiscalizada pelo MEC – e não pela OAB, que deve fiscalizar os
Advogados.
Assim,
o bacharel, portador de um diploma, já está juridicamente qualificado para o trabalho – se as faculdades
não prestam, é outro problema -, e não pode ter esse diploma rasgado por um
Exame inconstitucional, que atenta contra a sua liberdade fundamental de
exercício profissional. E que atenta contra o princípio constitucional da
isonomia, porque não existe Exame para outras áreas, que podem causar prejuízos
muito maiores à sociedade, como, por exemplo, a Engenharia e a Medicina.
De
acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96), “Os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão validade nacional como prova da
formação recebida por seu titular.” (Art. 48)
Que validade é essa, no entanto, que pode ser negada, sem mais
nem menos, pelos próprios Professores, Diretores e Reitores que foram
responsáveis pela formação jurídica e pela diplomação desses bacharéis?
De acordo com a mesma Lei, “A educação
superior tem por finalidade: (...) II - formar diplomados nas diferentes áreas de
conhecimento, aptos para a inserção
em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da
sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua.” (art. 43)
Mas
o Exame de Ordem decreta, três vezes ao ano: 90% dos bacharéis formados e
diplomados pelas nossas Faculdades de Direito não estão aptos para o exercício
da Advocacia, apesar de terem sido diplomados pelas suas Faculdades. Eles são
analfabetos, incompetentes e inaptos para a Advocacia. E os Professores,
Diretores e Reitores não se envergonham de concordar com isso. Seria hilário, se não fosse trágico!!
Portanto,
a verdade é que as Faculdades de Direito preparam, ou deveriam preparar, para a
Advocacia. Como é possível que os Diretores dessas Faculdades de elite venham
dizer, agora, em seu Manifesto, de maneira tão sucinta e peremptória, que o
Exame da OAB é
necessário para selecionar os bacharéis técnicamente
qualificados?
Veremos, a seguir,
que apenas uma das seis Faculdades que assinaram o triste Manifesto – e essa é
a elite - conseguiu aprovar mais da metade dos seus bacharéis no último Exame
de Ordem de 2.010. Ora, se esses bacharéis não estavam tecnicamente
qualificados, por que então receberam o diploma?? Antes, se não sabem ler ou
escrever, como afirmou o próprio Reitor da USP, por que será que foram
aprovados no vestibular dessas Faculdades?
Isso é um
rematado absurdo. É o fim do Mundo. Não falta mais nada.
Aliás, falta
sim. Nenhuma desgraça é completa. Pode ser que, em breve, tenhamos que ler um
“Manifesto dos Cursinhos Preparatórios em Defesa do Exame da OAB”. Ou, então,
um “Manifesto das Editoras que Publicam Material de Apoio ao Candidato do Exame
de Ordem”. Ou, ainda, o que é pior, pode ser que a nossa Suprema Corte decida,
encastelada nos píncaros de sua sapiência, que o Exame de Ordem é necessário e
que “a Constituição não passa de um maldito pedaço de papel”. (George Walker
Bush, 2.006)
2. Os signatários do Manifesto e os reprovados
das Faculdades de elite
Assinaram
o “Manifesto das Faculdades de Direito em Favor do Exame de Ordem” os Diretores
da PUC/SP, o Prof. Dr. Marcelo Figueiredo; da USP, o Prof. Dr. Antonio
Magalhães Gomes Filho; da Mackenzie, o Prof. Dr. Nuncio Theophilo Neto; da FGV,
o Prof. Dr. Oscar Vilhena Vieira; da FDSBC, o Prof. Dr. Marcelo José Ladeira
Mauad; e da FDUSJT, o Prof. Dr. Fernando Herren Aguillar.
Em rápida
pesquisa na internet, foi possível verificar, no Lattes, que nenhum desses
Ilustres Professores deve ter sido obrigado, muito provavelmente, a fazer o
Exame de Ordem, tendo em vista os períodos em que eles cursaram a graduação em
Direito: o Dr. Marcelo Figueiredo, na PUC/SP – 1978/1982; o Dr. Antonio Magalhães Gomes Filho, na USP –
1965/1970; o Dr. Nuncio Theophilo Neto,
na USP – 1976/1980; o Dr. Oscar Vilhena Vieira, na PUC/SP – 1984-1988; o Dr.
Marcelo José Ladeira Mauad, na UFJF – 1984-1989; e o Dr. Fernando Herren
Aguillar, na USP – 1982/1986.
Portanto,
eles não fizeram o Exame, que seria supostamente necessário para selecionar os
profissionais tecnicamente qualificados, porque todos eles se formaram antes de
1.996, e, mesmo assim, todos eles são hoje profissionais de renome, na Advocacia
e em outras áreas de atuação profissional, e são Diretores dessas conceituadas
Faculdades de Direito. No entanto, hoje, eles tentam justificar a necessidade
do Exame da OAB, para selecionar os
bacharéis tecnicamente qualificados. Pergunta-se, então: qual a seleção
correta? A das Faculdades, que aprovam esses bacharéis, ou a do Exame da OAB,
que os reprova?
Em rápida
pesquisa na internet, foi possível verificar, também, (veja
aqui) os resultados dessas seis Faculdades
de Direito, no Exame de Ordem 2010/3, considerados apenas os candidatos
inscritos, os aprovados e os percentuais de aprovação:
1.
PUC/SP – 516 -216 - 42,60%
2.
USP – 307 – 191 – 63,46%
3.
Mackenzie – 800 – 285 – 36,12%
4.
Direito GV – 38 – 16 – 42,11%
5.
FDSBC – 413 – 107 – 26,35%
6.
USJT – 249 – 43 - 17,48%
Portanto,
verifica-se que mesmo nessas Faculdades consideradas de elite, muitos bacharéis
ficaram reprovados no Exame, ou seja: 300 da PUC; 116 da USP; 515 da Mackenzie;
22 da FGV; 306 da São Bernardo; e 206 da São Judas Tadeu. Observa-se, ainda,
que apenas a USP conseguiu aprovar mais da metade de seus bacharéis. No outro
extremo, contudo, a São Bernardo aprovou apenas um bacharel em cada grupo de
quatro inscritos nesse Exame e a São Judas Tadeu aprovou apenas um bacharel em
cada grupo de seis inscritos. Mesmo assim, os Diretores dessas Faculdades preferem
transferir toda a culpa aos bacharéis/acadêmicos e assinam um Manifesto
dizendo, simplesmente, que o Exame da OAB é necessário para selecionar os
bacharéis tecnicamente qualificados!!!
Assim,
depois de estudarem cinco anos, pagando mensalidades caras, que chegam a
R$3.562,00, esses bacharéis em Direito não podem trabalhar na Advocacia. Eles
não tem uma profissão liberal, porque não estão tecnicamente qualificados,
segundo os dirigentes da OAB e os Diretores dessas Faculdades de Direito. De
quem será a culpa? Qual será a avaliação correta? A da Faculdade, ou a da OAB?
Por que será que a própria FGV, que elabora os Exames da OAB, reprovou 22
bacharéis formados pela sua Escola de Direito? Por que será que esses
bacharéis, se supostamente não estavam tecnicamente qualificados para a Advocacia,
receberam da Escola de Direito da FGV um diploma, um documento público,
registrado pelo MEC, que deveria atestar
a sua qualificação profissional??
Por que
será que a avaliação aplicada pela FGV, ao longo de seu Curso de Direito, é tão
diferente da avaliação que ela aplica no Exame da OAB?
3. A opinião do Reitor da USP
O Prof. Dr. João Grandino
Rodas é o atual Reitor da USP, mas ele já foi Diretor da Faculdade de Direito.
O seu discurso combina perfeitamente com o discurso dos seis Diretores de
Faculdades de Direito de São Paulo que assinaram o Manifesto. Para ele, o Exame
de Ordem é necessário, porque “serve como uma porteira mínima. Nós
temos um número grande de bacharéis em Direito que não sabem ler ou escrever.”
Ressalte-se
que o Prof. Dr. João Grandino Rodas também não fez o Exame de Ordem, porque ele
fez a sua Graduação em Direito na própria USP, no período de 1.965 a 1.969. O Exame somente se tornou
obrigatório 27 anos depois. Apesar disso, mesmo sem ter sido avaliada pela OAB
a sua qualificação profissional, ele exerceu e exerce, além do Magistério, inúmeros
cargos da maior relevância, no Conselho Administrativo de Defesa Econômica –
CADE, no Sistema Econômico Latino Americano – SELA, no Ministério das Relações
Exteriores, e no Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
Em 2009, quando o Dr. João
Grandino Rodas ainda era Diretor da Faculdade de Direito da USP, que aliás é a
mais tradicional do Brasil – são 184 anos das famosas “Arcadas” –, ele gravou
esta entrevista, da qual foi extraído o trecho a seguir: (ouça a entrevista)
...”Então, essa questão em
primeiro lugar do ensino superior no Brasil, o nó de górdio é justamente o
ensino básico, é justamente o ensino secundário. Isso precisa urgentemente
melhorar. E todos os controles que o MEC possa fazer, quer sobre a faculdade de
Direito, quer sobre as outras faculdades, isso não será nada mais do que
paliativo se não se resolver o aspecto fundamental e básico que é o da pífia
escolaridade básica e que nós
aceitamos nas Universidades pessoas, muitas vezes, para ser muito claro,
analfabetas. E uma vez entrando na Universidade a maioria deles
permanece assim e acaba saindo quase tão analfabeto quanto entraram. Então isso
é mais agudo no ensino jurídico, é mais agudo justamente porque muita gente
procura o curso de Direito ainda como um meio de acesso social, que no passado
foi uma grande alavanca, mas que hoje só o será se a pessoa realmente puder ter
basicamente uma formação aceitável. Se não, ao invés de ser uma glória, ao
invés de ser um modo de atingir alguma coisa, será um opróbrio, será uma
vergonha, porque a pessoa terá até receio de dizer que é bacharel em Direito.”
Mais recentemente, no mês
passado, em outra entrevista (veja aqui), desta vez
como Reitor da USP, o Prof. Dr. João Grandino Rodas disse, entre outras coisas,
que:
“A Faculdade de Direito do Largo São Francisco tem 460 vagas
anuais, enquanto toda a escola de enfermagem da USP tem 80 anuais. Por isso que
eu digo que não são só as faculdades privadas que caíram no pecado de expandir
o curso de Direito. E daí nós temos esse fenômeno dos bacharéis que não passam
no Exame de Ordem, mesmo não sendo a prova dificílima. (…) As duas escolas que
mais aprovaram, em São Paulo, são a Faculdade de Direito da USP e a da Unesp.
Em uma escola como a USP, que se diz de ponta, como que passam só 63% dos
alunos inscritos? Isso é um absurdo. Há
uma falha na avaliação lá dentro. Quer dizer, é uma escola que tem os
melhores professores, os melhores alunos e as melhores bibliotecas. O que está falhando certamente é
avaliação, porque não é possível que quase 40% não passem em um Exame
de Ordem que é, como eu disse, simples. A impressão que eu tenho é que o ensino
primário, o ensino fundamental e o médio pioraram em todo o país. (…) Não sou
fã irreversível do Exame do Ordem. No entanto, na atual conjuntura, ela serve
como uma porteira mínima. Nós temos
um número grande de bacharéis em Direito que não sabem ler ou escrever.
(…) O problema é que as pessoas
acabam recebendo o diploma sem ter uma condição mínima. Por exemplo, onde ficam os 40% de alunos
da Faculdade de Direito do Largo São Francisco que não passaram no exame?
(…) Mas não se pode dizer: “Farão o Exame seguinte”. Isso significa que a
escola tem que se corrigir em uma série de coisas, porque eles foram
reprovados.”
Na minha opinião, o Prof.
Dr. João Grandino Rodas deveria responder as seguintes perguntas:
1. Por que será
que as Universidades aceitam pessoas analfabetas?
2. Por que será
que as Universidades entregam diplomas a “um número grande de bacharéis em
Direito que não sabem ler ou escrever”?
3. Por que será
que “as pessoas acabam recebendo o diploma sem ter uma condição mínima”?
4. Engenheiros e
Médicos, por exemplo, também estão recebendo o diploma sem ter uma condição
mínima?
5. Por que será
que a avaliação “lá dentro” está falhando?
6. Onde ficam os “40% de alunos da Faculdade de
Direito do Largo São Francisco que não passaram no Exame?”
4. A opinião de um Professor da
USP
No último
Exame de Ordem de 2.010, foram 116 os bacharéis formados pela USP que ficaram
reprovados.
Qual
seria a solução para esses bacharéis desempregados?
Onde ficam os “40% de
alunos da Faculdade de Direito do Largo São Francisco que não passaram no
Exame?”, como indaga o próprio Prof. Dr. João Grandino Rodas?
Reprovados
no Exame da OAB, eles não são nada. Para os concursos públicos da Magistratura
e do Ministério Público, a Constituição exige três anos de atividade jurídica.
Restariam os concursos para Oficial de Justiça, Delegado de Polícia e alguns
outros, que exigem apenas nível superior, em qualquer área de conhecimento. Ou,
então, o trabalho em um escritório de advocacia, como “estagiário sem
carteira”.
Mas a
resposta mais adequada a essa pergunta do Prof. Dr. João Grandino Rodas nos é
dada por um Professor da própria USP, o Professor Doutor Víctor Gabriel Rodríguez: (veja aqui)
“...o que resta para um bacharel em
Direito, neste país, se reiteradamente reprovado no exame da OAB? (...) Última
alternativa: diplomado, porém reprovado e desempregado, o bacharel é compelido
a aceitar o convite da instituição que o formou, para que curse uma
pós-graduação (ali mesmo) e então ingresse em seu quadro docente. Porque,
apesar de não poder exercer a advocacia, pode sim ocupar um cargo de professor
na casa que sempre o acolhe. Não só isso é frustrante, como sem dúvida ofende
outro princípio constitucional, o da dignidade da pessoa humana: formado para a advocacia, o bacharel
descende à condição de professor universitário.”
Tem toda
a razão o Professor Víctor. O professor universitário, neste País, como todos
os outros professores, com as raras exceções das “ilhas de excelência”, não
passa de um detalhe na conjuntura mercantilista que domina a educação brasileira.
O
Professor de Direito deve ser, mesmo, muito inferior ao Advogado.
Recentemente,
uma Coordenadora de uma Faculdade de Direito, que é também Conselheira da OAB,
questionada a respeito do salário que eu passaria a receber, devido à redução
da carga horária para apenas uma aula semanal, e tendo em vista a questão
do salário-mínimo do professor, que os dirigentes da OAB defendem, para
melhorar a qualidade do ensino, disse textualmente que estaria “sempre defendendo os salários dignos para
o professor (mesmo porque me incluo no quadro de docentes) que
exerça a profissão de advogado acumulada com a vida acadêmica, que é bem diferente
do advogado que é somente professor!”
Ou seja:
eu não sou Advogado, sou apenas
Professor, apesar de estar inscrito na OAB/PA há 45 anos e pagar
sempre, religiosamente, as minhas anuidades. Eu não sou Advogado, apesar de já
ter exercido os cargos de Técnico de Tributação/Auditor Fiscal da Secretaria da
Receita Federal, Advogado do Banco Central, Assessor Jurídico do Tribunal de
Contas do Estado, Assessor de Procurador do Ministério Público Estadual e
apesar de já ter ajuizado algumas ações, nestes 45 anos. Mas hoje, na opinião
dela, eu não sou Advogado, apesar de estar lutando, há sete anos, contra o
Exame da OAB, e por essa razão, sendo apenas professor, posso perfeitamente
receber um salário de 200 ou 300 contos de réis!
O
professor não passa de um detalhe, mesmo. No caso da USP, evidentemente, que é
uma instituição pública, não se pode falar de “conjuntura mercantilista que
domina a educação brasileira”. Os problemas da educação pública são outros, mais
pelo viés corporativista, e não poderão ser abordados neste momento.
Portanto,
na minha opinião, as cinco primeiras perguntas do tópico anterior poderiam ser
respondidas sucintamente pelo Prof. Dr. João Grandino Rodas: “Porque as
Universidades precisam de dinheiro”.
Se as
Universidades e as Faculdades de Direito “aceitam pessoas analfabetas”,
“entregam diplomas a bacharéis em Direito que não sabem ler ou escrever”, enfim,
se a avaliação está falhando – e deve estar falhando, também, para Medicina,
Engenharia e para outras áreas, claro -, como afirma o Ilustre Reitor da USP,
isso ocorre porque elas precisam de alunos, elas precisam de dinheiro, porque
são instituições privadas, que dependem, naturalmente, do lucro de suas
atividades. Na USP, que recebe verbas públicas, os motivos devem ser outros,
como por exemplo a não redução do número de vagas, que poderia implicar talvez
na redução da carga horária dos professores.
O que se
pode observar, assim, é que os professores e os acadêmicos/bacharéis são usados
por essas instituições, públicas ou privadas, em benefício de seus interesses,
dos interesses de seus dirigentes e dos interesses dos políticos, dos
dirigentes do MEC, dos dirigentes da OAB, dos cursos preparatórios para o Exame
da OAB, enfim, em benefício dos interesses gerais da exclusão social e da
reserva de mercado.
Nunca é
demais lembrar que o Brasil tem apenas 11% de acesso ao ensino superior, tecnicamente
empatado com o Haiti!!!!
E
eles não se cansam de falar em “proliferação de faculdades”, para defender a
necessidade do Exame da OAB!!!
No
mesmo artigo acima citado, o Prof. Víctor disse ainda que;
“...o
pior é ouvir dizer que nosso Guardião da Carta Magna estará na iminência de
considerar constitucional o Exame da OAB. Prefiro entender, a princípio, que os atuais Ministros, do
alto de seu pedestal, não compreendem a realidade do País, portanto, se assim
decidirem, o farão por miopia, não por má-fé. (...) Isso sem falar na evidente
constrição ao princípio do livre exercício profissional que o Exame de Ordem
representa. Qualquer cidadão deve, em querendo, exercer o direito de ascender à
profissão de advogado - ou de médico, ou de engenheiro - sem a intervenção
desses verdadeiros poderes paralelos que os tais órgãos de classe compõem.
(...) O número elevadíssimo de reprovados nesses processos seletivos privados
autoriza afirmar que a exigência de um exame, posterior, de Ordem é abuso de
poder e vedação, repito, ao livre exercício profissional.”
5. Considerações Finais
O Exame
de Ordem é inconstitucional. Fere o princípio constitucional da isonomia,
porque se aplica apenas aos novos bacharéis em Direito. Restringe, sem qualquer
razoabilidade, a liberdade de exercício profissional dos bacharéis em Direito,
cláusula pétrea consagrada em nossa Constituição, deixando ao livre arbítrio de
um Conselho Profissional a determinação do percentual de bacharéis em Direito
que devem ser aprovados nesse Exame.
De acordo
com os seus defensores, os diplomas das Faculdades de Medicina, Engenharia e
outras atestam a qualificação dos profissionais que elas formam, mas não o
diploma do bacharel em Direito. O diploma do bacharel em Direito não serve para
nada. O bacharel em Direito tem que ser qualificado pela OAB, através do Exame
de Ordem.
Os
Professores de Direito, os Diretores de Faculdades de Direito e os Reitores que
defendem o Exame da OAB como
necessário para comprovar se os bacharéis em Direito estão tecnicamente
qualificados para o exercício da Advocacia estão apenas dizendo à
sociedade brasileira, e às famílias dos bacharéis em Direito, que 40% de seus
alunos – em alguns casos, até 90% ou mais – são analfabetos, despreparados e
completamente incapazes de exercer a advocacia.
E que
eles, os Professores, os Diretores, os Coordenadores, os Reitores, os donos de
Faculdades, os empresários da educação, que aprovaram esses bacharéis e que
lhes entregaram os seus diplomas, devidamente registrados pelo MEC, não tem
nada a ver com isso. A culpa é toda dos bacharéis, que só queriam saber de
pagar as suas mensalidades e que não queriam estudar.
Seria
hilário, realmente, se não fosse tão trágico, porque são milhões de pessoas que
gastam o que não podem, e até mesmo se endividam, para pagar essas mensalidades,
e depois ficam impedidas de trabalhar.