EXAME DE ORDEM: INGREDIENTE
EXPLOSIVO
Reynaldo Arantes
Bacharel em Direito pela Unoeste de Presidente Prudente, Presidente Estadual
Paulista e Vice-Presidente Nacional do MNBD.
Email: mnbd.sp@uol.com.br
Se há na história da
humanidade algo que deveria servir de lição a todos os seres humanos, é que as
receitas, as fórmulas, as leis devem ser seguidas.
As donas de casa sabem
muito bem que podem confiar nas receitas herdadas de suas mães e avós para fazer
quitutes que agradam toda a família e a mantém unida em torno da mesa de
refeições. Claro que sempre há algo não escrito, passado através de sussurros
na base do ouvido, um segredinho entre mãe e filha, que faz com que o sabor
especial seja alcançado.
Os químicos sabem que um
átomo a mais ou a menos na formulação faz a diferença final entre o resultado
esperado e um inesperado. A precisão faz toda a diferença. Sem fórmula exata
não há o resultado esperado e a combinação exata, na medida exata pode fazer
uma pedra filosofal.
Os juizes também seguem uma
receita, uma fórmula. Ela é do conhecimento das partes ativas e passivas e se
há qualquer desvio, qualquer ingrediente não previsto ou a falta de um, o
resultado não será justo e os Tribunais terão de corrigir para produzir
Justiça.
O Direito é – na minha
modesta opinião – o ramo cientifico que agrega todos os demais. É o eclético
dos ecléticos, pois interage com todas as ações humanas em todas as esferas.
Assim, seus profissionais adicionam a cada dia mais e
mais minúcias das relações humanas em sua bagagem profissional e de vida.
Há uma divisão entre os
operadores do Direito: os públicos e os privados. Os públicos – juizes,
procuradores, promotores, defensores, advogados públicos – que defendem a res publica e são concursados,
e os privados, advogados agregados
A receita do sucesso da OAB
foi recheada de ações heróicas e números importantes, como os 26 advogados que
participam da eleição de Francisco de Montezuma em 21
de agosto de 1843 para presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros.
Destaque também para os decretos nºs 19.408 (criou a
OAB), 22.784 (Aprovou o estatuto da OAB) e 22.478 (consolidou e regulamentou a
OAB). O Número 4.215 é importante por ser a Lei do Estatuto da Advocacia
inicial. Grande avanço e base da resistência a ser exercitada em defesa da
democracia já no inicio do ano seguinte à sua promulgação: 1.964.
A ação de homens e mulheres
especiais em um período de tormenta política e jurídica, construiu um nome que
é respeitado por toda a Nação: Ordem dos Advogados do Brasil.
Mas a tradição, o exemplo de
vida e o respeito à Democracia, receita de sucesso da entidade e de seus
profissionais, não é seguido no inicio dos anos 90. o Deputado Leite Chaves propõe o Projeto de Lei 201/91, para
instituir novos estatutos para a OAB. A mensagem de Veto Presidencial nº 736 era mais que explicita. Vejamos “ipsis
líteris”:
“ MENSAGEM Nº 736, DE 24 DE ABRIL DE 1992.
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do parágrafo 1° do artigo 66 da
Constituição Federal, decidi vetar integralmente, por
considera-lo contrário ao interesse público, o Projeto de Lei n° 201, de
1991 (n° 92/90 no Senado Federal), que "Altera a Lei n° 4.215, de 27 de
abril de 1963, e torna obrigatório o Exame de Ordem para admissão no quadro
de advogados".
A Lei n° 5.842, de 6 de dezembro de 1972, reiterada pela de n° 5.960, de 10 de
dezembro de 1973, tornou dispensáveis o Exame de Ordem e a comprovação do
exercício e resultado do estágio profissional, de que trata o art. 53, caput,
do Estatuto da OAB, para admissão no quadro de advogados, no caso de
candidatos que realizem, junto às respectivas faculdades, estágio de prática
forense e organização judiciária.
A proposição ora vetada impõe com exclusividade o Exame de Ordem, tornando
dispensáveis, pois, quer o estágio profissional, quer o estágio de prática
forense e organização judiciária.
Bem se vê que legislação copiosa não é panacéia para a advocacia de baixa
qualidade a que alude, em tons muito fortes, o ilustre autor do projeto.
Ademais disso, questionam profissionais do Direito o adequado aprestamento
técnico-jurídico dos advogados indicados por algumas Seccionais da OAB para
elaborar o exame e avaliar os estudantes, no cotejo com professores
universitários habituados a essa tarefa.
A melhoria da qualidade dos serviços de profissionais liberais é vinculada e
dependente tanto de apropriada formação humanística, que deve ser
propiciada pelo ensino de 2° grau, quanto de sólida base teórica no
correspondente domínio científico, a ser adquirida no curso universitário.
É, portanto, esta proposição contrária ao interesse público, que
reclama profunda revisão no trato da matéria.
Estas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar totalmente o projeto
em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do
Congresso Nacional.
Brasília, 23 de
novembro de 1992.
Fernando Collor
de Mello
As partes grifadas por nós,
destacam pontos que deveriam ter levado seus autores a sopesar seus atos na
balança da história. Diferentemente dos que os precederam, estes homens não
quiseram seguir a receita, a fórmula, o exemplo, a sapiência dos antigos e
perseveraram em seu erro.
Obtiveram sucesso com a
promulgação da lei 8.906/94, iniciam então a aplicação de uma norma engendrada
para fazer uma reserva de mercado para si próprios. A
receita utilizada rende mais empregos para os já inscritos, com vagas e mais
vagas em cursinhos preparatórios para o criado exame de ordem e gera rios de
dinheiro. Milhares de bacharéis reprovados voltam a fazer exames e com
pagamento de taxas de inscrição absurdas, geram outro rio de dinheiro para a
OAB e para as empresas que aplicam o exame. A nascente destes mananciais de
dinheiro extorquido de milhões de bacharéis sofridos é conhecida, mas a foz
destes rios é misteriosa e obscura. Aparentemente, porém, a mudança na fórmula
de sucesso dos antigos havia sido vitoriosa.
A nova fórmula começa a
marginalizar centenas, depois milhares e hoje milhões de profissionais de nível
superior, formados em ??? Direito...
Preparados para defender seu
próximo, os Bacharéis em Direito (não podem usar o termo descritivo técnico
profissional de “advogados” - norma prevista já no art.67, § único, da lei
4.215/63 – já que são barrados antes de se inscreverem no seu Conselho
Profissional) iniciam um silencioso levante em busca de seu Direito, usando a
receita, a estratégia aprendida nos bancos acadêmicos. Buscam os caminhos
sociais, depois os jurídicos e os políticos para fazerem valer seu Direito e
demonstrar que a Constituição é a Lei Magna e tem de ser respeitada.
Se
estruturam em silêncio
e nasce o MNBD – Movimento Nacional dos Bacharéis em Direito – para mostrar
finalmente seu rosto
O ano de 2007 era a data
correta para um levante organizado. O MNBD ainda sem denominação oficial e
ainda engatinhando, começa a ter mais e mais colegas se unindo e os debates e
discussões chegam aos mais longínquos rincões. A receita de “matar a cobra e
mostrar o pau” ou, de fazer uma afirmação jurídica e mostrar a fundamentação se
amplia. O exame de ordem passa a ser base em mais projetos. O Deputado Federal
Pedagogo Edson Duarte, da Bahia, abraça a fundamentação de
inconstitucionalidade no PL 2195/2007 e a mesma tese é referendada pelo
Deputado Federal Militar Jair Bolsonaro, do Rio de
Janeiro, no PL 2426/2007. Ainda em 2007, um bacharel e um acadêmico também se
destacam. O Deputado Federal Bacharel em Direito é Waldir Neves, do Mato Grosso
do Sul, que propõe o PL 2.790/2007 propondo a substituição do exame de ordem
por um estágio de 2 anos junto a um advogado com mais de 5 anos de OAB; o
Deputado Federal Acadêmico é o Paraibano Walter Brito, que propõe o PL
2.567/2007 e autoriza o bacharel a advogar nos Juizados Especiais sem as
limitações atuais.
O ano legislativo de 2008
ainda se inicia e mais um projeto vem alterar o exame de ordem. Desta vez, o
Deputado Federal mineiro Lincoln Portela, através do PL 2996/2008 quer acabar
com a anomalia que é o Bacharel em Direito que foi aprovado na primeira fase do
exame ter que a fazer novamente se não passar na segunda fase.
A questão se torna nacional:
Amapá, Paraná, Rio de Janeiro, Bahia, Paraíba, Mato Grosso do Sul, Minas
Gerais, parlamentares de sete estados apresentam projetos para extinguir ou
modificar o exame. Audiências Públicas em Vitória/ES, Porto Alegre/RS, São
Paulo/SP e Brasília/DF tem a presença do MNBD debatendo em público a questão
com a OAB. A OAB não rebateu a inconstitucionalidade do exame de ordem e apenas
manteve seu discurso retórico e vazio de que a culpa é das universidades e da
má formação educacional do Bacharel
Quero destacar dentre os
parlamentares citados, o acadêmico paraibano Walter Brito. Assim como passei
pelos bancos acadêmicos acreditando que bons alunos não teriam problema com o
exame de ordem e só me desiludi ao fazer o referido exame e constatar o que já
haviam me alertado, a grande massa acadêmica de Direito ainda tem esta
mentalidade por falta de nossas Universidades levarem a questão para as salas
de aula e por causa do conflito íntimo de alguns professores de Direito: Sua
lealdade à Constituição ou à OAB.
O Deputado Walter Brito,
ainda em formação acadêmica, teve a sensibilidade de buscar se informar sobre
uma questão que aflige os que já se formaram. Busca com sua proposição – um dos
primeiros atos de seu mandato, já que era suplente - abrir um mercado de
trabalho digno e uma possibilidade de exercício profissional negada aos
Bacharéis
Tenho esta certeza, mesmo sem
ter contato – o que espero ter – com o nobre parlamentar, porque ele, como os
demais seguem a receita tradicional dos verdadeiros parlamentares: ouvem a voz
das ruas, analisam onde está a verdade, a necessidade,
a justiça e apresentam projetos que representem a vontade popular. São as Vozes
do Povo na casa do Povo Brasileiro. São os seguidores dos mestres parlamentares
que fizeram a Constituição em 1.988. Há ainda os que fizeram a Constituição e
agora lutam pela sua aplicação como o advogado
paranaense Max Rosenmann.
Quem não segue a tradição, a
receita, a fórmula é a OAB. Seus líderes sabem que o exame é inconstitucional
formal e materialmente e que já foi revogado pela Lei 9394/96, um ingrediente
explosivo na fórmula, na receita engendrada. Sabem eles que este exame é feito
para reprovar em massa e fazer reserva de mercado. Sabem eles a foz dos rios de
dinheiro extorquidos de bacharéis que só querem trabalhar para sustentar suas
famílias e pagar seus financiamentos educacionais. Sabem eles que não estão
seguindo o exemplo de homens e mulheres notáveis que os antecederam e que
sacrificaram suas vidas para que o Brasil tivesse uma Constituição cidadã e que
se estivessem vivos, devotariam suas vidas para que
ela fosse respeitada. Estes profissionais foram homenageados com a inclusão do
Art. 133 da CF: O advogado é indispensável à Justiça.
O exemplo destes
nomes históricos da OAB é seguido hoje pelos membros do MNBD, que não tem medo
de mostrar a face ao adversário, de dar seu nome e endereço em público, que
tiram dinheiro do bolso (tudo é gratuito no MNBD e ainda não temos apoiadores
financeiros) para levar a luta ao nível que está hoje. Pessoas que viajam,
debatem, fazem palestras, imprimem panfletos, gravam CDs e DVDs para distribuição, usam suas horas de sono e o
dinheiro que iria para suas mesas para levar adiante uma luta pelo Direito de
milhões.
Assim como a
receita, a fórmula, o exemplo dos históricos nomes da OAB e do anterior
Instituto dos Advogados Brasileiros, em defesa da República, da Democracia e da
Liberdade, nós lutamos hoje para mostrar ao Brasil que sem respeito à
Constituição e aos direitos pétreos nela insculpidos,
nunca teremos um Estado Democrático de Direito e para que isto se torne
realidade, um dos pontos cruciais é a extinção do Exame de Ordem da OAB.